"Excludente de ilicitude" é licença para matar até em manifestações
(Crédito: Fernanda Cruz/EBC)
Via Rede Brasil Atual - O presidente da República, Jair Bolsonaro, enviou ao Congresso nesta quinta-feira (21), um Projeto de Lei (PL) que amplia o conceito de excludente de ilicitude para as Forças Armadas, Força Nacional de Segurança, polícias e bombeiros. A proposta complementa, segundo o presidente, o “pacote anticrime”, do ministro da Justiça, Sergio Moro em tramitação no Congresso. O intuito é ampliar a chamada “licença para matar”, como apontam diversos especialistas do campo da segurança pública, para “casos de terrorismo”, isentando de eventuais punições os militares que atuem violentamente nas chamadas operações de Garantia da Lei e da Ordem (GLO).
Coordenadora-adjunta da Comissão de Amicus Curiae do Instituto Brasileiro de Ciências Criminais (IBCCrim) Débora Nachmanowicz, diz, no entanto, que os termos da medida de Bolsonaro poderão ser aplicados inclusive sobre manifestações populares, o que coloca em riscos os movimentos sociais, que ficarão reféns dos agentes da segurança pública quanto ao ato ser interpretado ou não como “terrorismo”.
“Infelizmente, isso é muito arbitrário, vai depender de quem está na rua, que é a polícia, que é geralmente a Polícia Militar, e que a gente sabe, infelizmente, que acontece muitos abusos, arbitrariedades, violências. Consequentemente, dessa maneira como está no projeto, pode agravar sim esses problemas, pode gerar sim uma impunidade dessas pessoas que precisariam ter algum tipo de limite”, afirma Débora em entrevista aos jornalistas Marilu Cabañas e Glauco Faria, da Rádio Brasil Atual.
Na prática, avalia a coordenadora-adjunta, o anúncio do PL, indica avanço sobre os direitos dos civis cada vez maior. “Aí é que está o risco”, aponta. “O maior problema aqui é que o Estado tem todo o poder. O Estado, a polícia, o Ministério Público, eles têm o poder, e o cidadão tem só os seus direitos, a lei e a Constituição para protegê-los”, contesta.
Inicialmente a “licença para matar” estava prevista na proposta do ministro Moro, mas foi retirada pelo grupo de trabalho que analisa o “pacote anticrime” na Câmara, com base em um substitutivo apresentado pelo deputado Marcelo Freixo (Psol-RJ). Moro aliás, de acordo com a Folha de S. Paulo, voltou a defender, também nesta quinta, a autorização para a letalidade policial sem punição quando os agentes tiverem que assim agir por “escusável medo, surpresa ou violenta emoção”.
Bolsonaro, por sua vez, para defender sua proposta de isentar militares de responsabilidades durante as GLO, chegou a declarar, em live no Facebook, que “não vai precisar o elemento atirar no policial ou em um integrante das Forças Armadas, quem estiver portando um arma de forma ostensiva vai levar tiro, porque essa bandidagem só entende uma linguagem, linguagem que seja uma resposta mais forte por parte da sociedade”.
Para Débora, para um governo que quer liberar e flexibilizar ainda mais o porte e a posse de armas, a afirmação do presidente é uma “contradição”.
Na verdade, ressalta, no país onde a polícia mata cinco pessoas por dia, isso só no Rio de Janeiro – de acordo com o Instituto de Segurança Pública (ISP) do estado, nos primeiros oito meses do ano foram 1.249 mortes por intervenção policial –, principalmente nas favelas e periferias, a afirmação de Bolsonaro tem alvos definidos.
“A gente sabe muito bem quem é o alvo dessas medidas, então não vai ser essa pessoa que tem esse porte de armas em um bairro nobre. Infelizmente isso vai focar a população pobre, periférica, pessoas do morro do Rio de Janeiro, que já são boa parte das vítimas e, como vimos nesse último ano, são muitos civis, crianças indo para a escola, voltando do futebol, então é uma desgraça”, afirma Débora.
De acordo com ela, o IBCCrim já estuda a admissão de Ação Direita de Inconstitucionalidade (ADI) no Supremo Tribunal Federal (STF) para tratar desses pontos das operações de Garantia da Lei e da Ordem. Débora espera que, tanto o STF, como o Legislativo, impeçam esse avanço do governo sobre os direitos da população.
“Esse projeto de lei é muito perigoso desde o início, essa questão da legítima defesa, dessa maneira que está sendo proposta, é um problema. Até porque a legítima defesa já existe no código de processo penal e ela já é uma razão de jurisprudência”, finaliza.
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