É assim que a Justissa se apequena
Por Tereza Cruvinel, no Jornal do Brasil:
Esta é a semana em que juízes federais farão greve, na quinta-feira, contra a supressão de privilégio, o auxílio-moradia de R$ 4.253,00, que a maioria recebe mesmo tendo imóvel próprio. O penduricalho, que não sendo considerado salário não é tributado, é um drible na regra do teto constitucional que permite aos juízes ganhar mais que os ministros do Supremo. O STF pautou a matéria para o dia 22 mas a decisão vem com atraso de três anos, tempo em que eles embolsaram a mordomia. Se derrubada, não será devolvida. Esta é também a semana crucial para o STF escolher outra forma de apequenar-se: para a ministra Cármen Lúcia, seria apequenante, com perdão do neologismo, uma deliberação sobre a prisão em segunda instância porque isso beneficiaria o ex-presidente Lula. Mas deixar de deliberar apenas para não benefi ciá-lo não seria também discriminação?, já perguntou o ministro Marco Aurélio Mello.
A semana é crucial porque, ao longo dela, o TRF4 deve concluir o julgamento dos embargos declaratórios da defesa de Lula, e depois disso a qualquer momento ele pode ser preso. A não ser que o STF tivesse revisto sua decisão de 2016, acolhendo a ação do PEN e a da OAB, invocando o preceito constitucional de que ninguém será considerado culpado antes do trânsito em julgado.
Irritado com a falta de apoio dos tribunais estaduais à greve de quinta-feira, o presidente da Ajufe, Roberto Carvalho Veloso, criticou o STF por ameaçar a mordomia dos juízes federais, deixando de fora as dos estaduais. A Ação Direta de Inconstitucionalidade (ADI) 4.393, por exemplo, trata dos “auxílios” da magistratura do Rio: saúde, alimentação, creche e um colar de gratificações. Mas o Supremo optou pela solução pequena, julgando apenas o desgastante auxílio-moradia. Desgaste é uma palavra que ajuda a definir a pauta do STF.
E o que tem isso a ver com Lula e a prisão em segunda instância? Aparentemente nada mas são decisões que expõem o Judiciário. A população, por mais retraída que esteja em relação ao que acontece na esfera pública, não perdeu a capacidade de relacionar as coisas e tirar suas conclusões. Então é esta a Justiça que passa o país a limpo?
A ministra Cármen não viu nada demais em receber Temer no sábado em sua casa, embora ele seja investigado em dois processos. Mantém a decisão de não pautar a questão da segunda instância. Até agora, nenhum ministro parece disposto a peitá-la, levando o assunto diretamente ao plenário. Lavando as mãos agora, deixando Lula ser preso, o apequenamento será do mesmo tamanho. Na História, talvez vire um estigma como o da negação de habeas corpus a Olga Benário, a mulher de Prestes que o Brasil deportou para a Alemanha nazista, onde morreu num campo de concentração.
E o pior ainda pode vir: se, depois que Lula for preso, o STF achar que já pode derrubar a decisão de 2016, por ter dado mostras de imparcialidade, será do mesmo modo acusado de casuísmo. Pois Lula e outros tantos que cumprem pena por condenação em segunda instância serão soltos, e o Supremo será acusado de ter agido para soltá-lo. E ele voltará fortalecido, ainda que para ser apenas cabo eleitoral do candidato que o PT, em hipótese alguma deixará de lançar. Ciro Gomes pode anotar.
Em tempo: sobre a Justissa, saiba mais no ABC do C Af.