Justiça condena por tortura no Regime Militar. Alô, alô STF !
Saiu no Estadão: Justiça condena RS a indenizar por tortura durante o regime militar.
publicado
27/04/2011
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Saiu no Estadão:
Justiça condena RS a indenizar por tortura durante o regime militar
Decisão é tida como 'inovadora' por entidades de defesa dos direitos humanos
Elder Ogliari, de O Estado de S.Paulo
PORTO ALEGRE - A 5ª Câmara Cível do Tribunal de Justiça considerou a tortura como crime imprescritível e condenou o Estado do Rio Grande do Sul ao pagamento de R$ 200 mil, por danos morais, a um homem preso e agredido pelo regime militar em 1970.
A decisão, tomada por unanimidade no dia 20 de abril, foi vista como "inovadora" pelo Movimento de Justiça e Direitos Humanos do Rio Grande do Sul. "Abriu-se uma porta e um precedente", avalia o conselheiro da organização não governamental, Jair Krischke. "A Justiça começa a entender que é preciso reparar esses males".
O autor da ação, Airton Joel Frigeri, foi preso em abril de 1970, aos 16 anos, quando estava empregado como auxiliar de escritório do Sindicato dos Metalúrgicos e estudava no Ginásio Noturno para Trabalhadores, em Caxias do Sul, na serra gaúcha. Acusado de ter ligação com o grupo guerrilheiro VAR-Palmares, foi levado para delegacias de Caxias do Sul e Porto Alegre e, ainda, para a Ilha do Presídio, no Lago Guaíba, sofreu choques elétricos, golpes com pedaços de madeira e borracha e ouviu outros presos sendo torturados. Solto em agosto daquele ano, foi proibido de estudar e passou a ser visitado por agentes do SNI, Dops e Polícia Civil até 1978, mesmo tendo sido julgado e absolvido pelo Superior Tribunal Militar.
Em 1998 Frigeri recebeu R$ 30 mil de indenização prevista por lei estadual a presos ou detidos por motivos políticos entre 2 de setembro de 1961 e 15 de agosto de 1979. Em 2008, considerando a reparação insignificante diante dos danos que sofreu, levou o caso à Justiça. No julgamento de Primeiro Grau, a ação foi considerada extinta, por prescrição. Decidiu então recorrer ao Tribunal de Justiça.
O desembargador Jorge Luiz Lopes do Canto, relator da apelação, afirmou que "não há dúvidas quanto à ilicitude dos atos praticados pelos agentes públicos, nem quanto ao nexo causal ou dever de reparar, nem ao menos da responsabilidade objetiva que cabe ao Estado em função da prática de tortura comprovada no feito e realizada por aqueles". Também sustentou que "a dignidade da pessoa humana é um dos fundamentos da República Federativa do Brasil, e a tortura o mais expressivo atentado a esse pilar da República, de sorte que reconhecer imprescritibilidade dessa lesão é uma forma de dar efetividade à missão de um Estado Democrático de Direito".
Considerou ainda que "causa repugnância a forma covarde com que o autor foi tratado, um adolescente que pouca ou nenhuma ameaça poderia produzir ao regime antidemocrático instaurado, denotando-se que as agressões mais se prestaram a satisfazer o caráter vil dos agressores, do que assegurar a perpetuação do regime, atitudes que eram incentivadas - ou ao menos toleradas - pelas autoridades competentes". O voto foi seguido pelos outros dois desembargadores da 5ª Câmara Cível.
"A advogada Caroline Sambaquy Giacomet, do escritório Corso & Corrêa Advogados Associados, representante de Frigeri, diz que a ação foi movida contra o Estado porque a prisão e a tortura foram praticadas por agentes da Polícia Civil e Brigada Militar. Também informa que há outra ação indenizatória, contra a União, tramitando na Justiça Federal, com decisão de Primeiro Grau favorável ao seu cliente, mas à espera do julgamento do recurso das duas partes ao Tribunal Regional Federal.
A Procuradoria Geral do Estado (PGE) emitiu uma nota afirmando que, embora ainda não tenha sido notificada da decisão, não vai contestá-la no ponto referente à prescrição. "Na mesma esteira do entendimento do governador do Estado (Tarso Genro, do PT), a PGE adota a posição acerca da imprescritibilidade do crime de tortura, vez que se trata de crime de lesa humanidade que atenta contra a dignidade da pessoa humana e assim é tratado pela Constituição Federal de 1988 e pelos instrumentos internacionais ratificados pelo Brasil", diz um trecho do texto. "Somente após a publicação do acórdão, a PGE poderá se posicionar, no caso concreto acerca de eventual outra matéria a ser objeto de recurso", conclui.
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