Zuza e Elis, "se fosse viva"
O ansioso blogueiro é fã do Mestre Zuza Homem de Mello - clique aqui para saber mais - desde que Frank Sinatra assinou aquele famigerado contrato com o Tommy Dorsey.
- Zuza, vim de casa até aqui com o Águas de Março no carro !
( O "jornalismo calendário" do PiG (*) lembrava que Elis "nos deixou há 30 anos" e "se fosse viva, Nara faria 70 anos".)
- Zuza, com a Elis não tem pra ninguém !
- Você sabia que a Elis não era uma cantora excepcional ?
- Que é isso, Zuza ? Ela era imbatível !
- O que o timbre da voz da Elis tem de especial ? E você sabe que o timbre é a identidade da voz, do cantor, a tua identidade, com esse toque anasalado ...
- É, a Glorinha Beutenmiller me mandava preservar esse timbre, porque me identificaria ...
- Claro, ela sabe das coisas ...
- Mas, e a Elis ela não era boa ?
- Claro, é a melhor de todas !, respondeu o Zuza.
- Então, o que faz dela melhor ?
- A interpretação, meu filho. A interpretação !
(Maria Callas, pensou o ansioso blogueiro.)
- E por que Águas de Março é a maior de todas as canções ?
- Bom, não sei explicar. Agora, vou te contar uma coisa, Zuza. Eu tava num taxi, no México, e o motorista me perguntou o que significava a palavra "toco"...
- Águas de Marco, interrompeu o Zuza. É a única música brasileira que tem essa palavra.
- Pois é, o cara traduziu a letra toda e empacou no "toco".
- A letra de Águas de Marco é Guimarães Rosa puro. Só o Tom poderia traduzir ela para o inglês e foi o que ele fez ...
- Mas, e a música, Zuza ?
- A música é simples. São três notas e nada mais. Olha só (e o Zuza repete, três, quatro vezes as mesmas notas). Eu tô cantando Águas de Março, não é isso ? Mas, não estou cantando ...
- Como assim, Zuza?
- Porque falta o arranjo do Tom, a harmonia de Águas de Março que está embaixo das três notas.
- Ah ...
E ficamos os dois a cantar Águas de Março ...
(O ansioso blogueiro se lembra de uma frase do Neschling: não fosse a harmonia, Beethoven corria o risco de ser medíocre.)
- Zuza, e além da Elis, quem mais ?
- As quatro grandes são ela, a Elizeth, a Nana e a Gal.
- Tá certo. Por que a Nana?
- A emoção.
- E a Gal ?
- A Gal é mais do que um ser humano.
- Como assim ?
- Ela é um instrumento musical. Você aperta ela e sai uma nota !
- Entendi. Agora, Zuza, deixa eu te confessar uma coisa, assim, só entre nós, com a confiança que uma velha amizade autoriza ...
- Pode falar eu sou um túmulo.
- Zuza, eu prefiro a Sétima à Nona do Beethoven !
- Claro, eu também ! A Sétima é a Suprema Sinfonia !
- Zuza, e o Tom, Zuza ?
- É pau, é pedra, é o fim do caminho ... É o toco sozinho ... Ele é a Sétima, a Nona ...
E lá vai ele pelo aeroporto afora.
Paulo Henrique Amorim
(*) Em nenhuma democracia séria do mundo, jornais conservadores, de baixa qualidade técnica e até sensacionalistas, e uma única rede de televisão têm a importância que têm no Brasil. Eles se transformaram num partido político – o PiG, Partido da Imprensa Golpista.