A própria Época, que tentou semana passada esconder o Daniel Dantas - clique aqui para ler - revela agora alguns dos caminhos que Dantas controlava para operar no governo FHC.
O instrumento é um notório lobista de nome Roberto Amaral.
Com mecanismos que só Freud poderia explicar, ao ler a Época este ansioso blogueiro se lembrou da desprezível circunstância de FHC ter nomeado o ex-Supremo Presidente Supremo do Supremo para o Supremo.
Leia a seguir a materialização do "batom na cueca"
O financista, o consultor e a "pessoa"
ÉPOCA revela os segredos dos e-mails de Roberto Amaral, o consultor que trabalhou para o Opportunity, de Daniel Dantas, durante o governo FHC
Wálter Nunes e Guilherme Evelin
Entre maio e junho de 2002, o advogado carioca André Leal Faoro viveu o dilema de deixar a família e trocar as delícias do Rio de Janeiro pela aridez de Brasília e por um cargo na administração pública federal. Faoro fora convidado para assumir a procuradoria-geral da Agência Nacional de Telecomunicações (Anatel). A proposta fora feita pelo economista Luís Guilherme Schymura, que substituiu Renato Guerreiro, o primeiro presidente da agência. Pelo convite, Faoro entraria no lugar do mineiro Antônio Bedran e seria responsável pela preparação dos pareceres jurídicos e pela representação na Justiça da agência reguladora do setor de telecomunicações. Mas o convite acabou não sendo realizado formalmente. Há duas semanas, num restaurante no centro do Rio de Janeiro, Faoro rememorou as circunstâncias do convite e lembrou que Schymura nunca lhe explicou por que a proposta não fora adiante.
O episódio parece apenas um lance trivial na rotina das substituições na burocracia brasiliense. Mas, enquanto André Faoro ruminava o convite de Schymura, uma poderosa rede de influências foi mobilizada para evitar sua nomeação. Na linha de frente dessa operação, estava um dos personagens mais ativos e menos conhecidos da história recente da política brasileira: o paulista Roberto Figueiredo do Amaral. Por 30 anos, Amaral trabalhara como executivo da construtora Andrade Gutierrez, em São Paulo. Como diretor da empreiteira, desfrutara o convívio dos mais influentes políticos paulistas e fizera história por sua desenvoltura no opaco mundo das empreiteiras e suas tratativas em busca de contratos de obras públicas. Paulo César Farias, o tesoureiro do ex-presidente Fernando Collor, considerava Amaral “um mestre”. Sérgio Motta, ministro das Comunicações do governo Fernando Henrique Cardoso, seu amigo, o chamava, em tom de brincadeira, de “gênio do mal”.
Ao Planalto
Roberto Amaral enviava mensagens ao endereço eletrônico dos ajudantes de ordens do presidente FHC. No dia 8 de março de 2002, ele enviou o e-mail ao lado (acima - PHA). Uma semana antes, a PF fizera uma busca e apreensão no escritório da Lunis, de Jorge Murad, marido de Roseana Sarney. FHC diz não ter recebido esses e-mails
O caso Anatel
No começo dos anos 2000, Amaral atuava como consultor do Opportunity, marca que reúne os fundos de investimentos comandados pelo financista baiano Daniel Dantas. Na ocasião, Dantas se tornara o protagonista da maior disputa societária da história recente do capitalismo no Brasil. Ele brigava com fundos de pensão e sócios estrangeiros pelo controle de empresas de telefonia privatizadas pelo governo FHC. Dantas buscava decisões favoráveis das autoridades em Brasília e arregimentara os serviços de Amaral para que ele o auxiliasse em sua contenda bilionária . “Eu precisava de alguém que me explicasse como funciona o Brasil do poder, e o Roberto era o homem ideal”, disse Dantas numa entrevista recente publicada na revista Piauí. Essas lições sobre o funcionamento do Brasil do poder e o estilo e a estratégia de Amaral ficam evidentes numa série de e-mails obtidos por ÉPOCA, que ele enviou e recebeu.
A correspondência eletrônica foi apreendida por agentes da Polícia Federal em dezembro de 2008, quando eles vasculharam os endereços de Amaral como parte da Operação Satiagraha, a mais rumorosa e polêmica ação da história recente da PF. Na casa de Amaral, os federais acharam um disco rígido de computador, que guardava e-mails numa quantidade suficiente para encher dez CDs. Tais e-mails serviram de prova em uma denúncia do Ministério Público, aceita pela Justiça em julho de 2009. Segundo a PF, que atestou a autenticidade dos e-mails por meio de uma perícia técnica, a correspondência registra a comunicação entre Amaral e Dantas (Dantas nega isso). E também inclui, de acordo com a PF, mensagens enviadas por Amaral a próceres da República e aos ajudantes de ordens do então presidente Fernando Henrique Cardoso. Por envolver autoridades com foro privilegiado, os e-mails encontram-se, desde 2009, sob a análise do procurador-geral da República, Roberto Gurgel, que estuda se eles contêm indícios que justifiquem a abertura de uma investigação policial.
Desencadeada em 2008, para investigar acusações de crimes financeiros contra Dantas e o Opportunity, a Operação Satiagraha gerou um sem-número de controvérsias. Dantas foi preso duas vezes – ambas por ordem do então juiz federal Fausto De Sanctis, de São Paulo – e solto duas vezes – ambas por decisão do então presidente do Supremo Tribunal Federal (STF), ministro Gilmar Mendes. O prende e solta causou uma crise sem precedentes no Judiciário brasileiro. O comandante da operação na ocasião, delegado Protógenes Queiroz, recorreu a métodos ilegais de operação (usou, por exemplo, agentes da Agência Brasileira de Inteligência para fazer escutas telefônicas à revelia da direção da PF), foi afastado do caso e condenado, em novembro do ano passado, pela Justiça Federal à pena de prisão por crime de violação de sigilo funcional e fraude processual. Como consequência desses métodos, diversas provas recolhidas na investigação foram questionadas pelos réus.
Quando os agentes vasculharam a casa de Amaral e apreenderam os e-mails, a Satiagraha já estava sob o novo comando, do delegado Ricardo Saadi. Sua equipe extraiu diversas novas conclusões que embasaram a denúncia apresentada pelo Ministério Público – e depois aceita pelo próprio juiz De Sanctis. Uma das dificuldades da PF, ao analisar os e-mails, foi decifrar seus remetentes, destinatários e conteúdos. De acordo com a denúncia, a PF concluiu que Dantas e Amaral, em suas comunicações, recorriam a vários endereços eletrônicos, codinomes secretos e frases elípticas, na tentativa de evitar ser descobertos. “Com o temor de ser identificados em suas mensagens, Roberto Amaral e Daniel Valente Dantas se tratavam por outros nomes ou por siglas, sendo que o primeiro, na maioria das mensagens eletrônicas, era tratado como “Rogério”, ou “Rogério Antar”, e o segundo por “DD”, “OVS”, ou “Olhos Verdes Sensuais”, escreveu o procurador Rodrigo de Grandis na denúncia. Segundo o texto de De Grandis, Amaral usava os endereços [email protected], [email protected] e [email protected] para suas mensagens. Dantas, de acordo com a PF, usava principalmente o e-mail sjward@ attglobalnet. Por meio de nota enviada por sua assessoria, Dantas afirmou que “não se correspondeu diretamente com Roberto Amaral”. O advogado José Luís de Oliveira Lima, que defende Amaral, disse que seu cliente não comentaria o conteúdo dos e-mails, porque a Satiagraha teria sido “produzida de forma ilegal, desprezando princípios processuais e constitucionais”. No momento, o Superior Tribunal de Justiça (STJ) discute a legalidade das provas obtidas pela PF na Satiagraha.
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