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Collor sobre Janot: é um poço de virtudes éticas !​

Por que arquivar o Aécio e não o Collor se os delatores são os mesmos criminosos ? - PHA
publicado 09/03/2015
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O Conversa Afiada reproduz discurso do Senador Fernando Collor no Senado, do mesmo púlpito em que discorreu sobre outro poço de virtudes, o Procurador Geral Roberto Gurgel.

(Não deixar de ler sobre a CPI do MP !).


PRONUNCIAMENTO



(Do Senhor FERNANDO COLLOR)

Sr. Presidente, Sras. e Srs. Senadores,

Há quase um ano o país tem vivido, de um lado, um clima de expectativa e espera e, de outro, de apreensão e desconfiança institucionais em relação ao andamento e os desfechos das apurações da chamada operação Lava-Jato.

Muito se especula, Sr. Presidente, muito se afirma, muito se acusa. O assanhamento dos meios é visível, e já se espraiou por toda a sociedade. Contudo, esse cenário, num clima de terra arrasada, vem sendo demasiadamente corroborado pela atuação do próprio Ministério Público, especialmente quanto ao suposto envolvimento de autoridades e agentes políticos. Nomes, imagens, listas, estranhas audiências e obscuras visitas somam-se a um universo de suposições, deduções, hipóteses, teses e teorias das mais diversas, em que tudo e todos são jogados na vala comum, como se fosse um prenúncio escatológico do país, de suas instituições e, propositadamente, de suas autoridades.

Sr. Presidente, Sras. e Srs. Senadores, não há como deixar de perceber algumas nuvens carregadas que gravitam em torno desta cena. A pergunta que faço é se é este mesmo o ambiente que o Ministério Público deseja e, mais do que isso, planeja? Ao fomentar a expectativa e a ansiedade da população, estará de fato seu comando exercendo suas atribuições com idoneidade, sensatez, responsabilidade e, principalmente, com estoicismo? Ou seria apenas um meio, um caminho, sem nenhuma sobriedade, para empunhar um cartaz em busca da pirotecnia de uma precoce, antecipada e momentânea celebrização, tão em voga nos últimos tempos?

Meu argumento, Sr. Presidente, é que ao longo de todo esse processo de investigação, bastava ao Ministério Público se utilizar de um simples instrumento, uma justa medida de bom senso e prudência nesses casos: a oportunidade de esclarecimentos prévios. Trata-se de um mecanismo sensato, óbvio, que poderia ter sido utilizado em qualquer caso, para qualquer pessoa sobre a qual houvesse indícios, suspeitas ou especulações, quanto mais no caso de agentes com mandato político, sujeitos permanentemente a todo tipo de especulação política, e perseguidamente expostos às elucubrações midiáticas.

A simples concessão dessa oportunidade, ou seja, a adoção do procedimento do prévio esclarecimento poderia, em muitos casos, evitar a abertura de inquéritos e, ao mesmo tempo, a exposição desnecessária, por um longo período, de pessoas e agentes supostamente envolvidos. Na prática, seria a chance de qualquer um, perante o Ministério Público, de esclarecer os pontos, tirar as dúvidas que por ventura pairassem e, mais ainda, expressar sua versão dos acontecimentos e a verdades dos fatos.

Sr. Presidente, Sras. e Srs. Senadores, se o Ministério Público, como preceitua a Constituição Federal, é essencial à função jurisdicional do Estado, se a ele incumbe a defesa da ordem jurídica, do regime democrático e dos interesses sociais e individuais – vejam bem, individuais –, por que então não agiu com denodo frente aos mesmos direitos pessoais, concedendo previamente a oportunidade de defesa por meio da simples metodologia do esclarecimento antecipado? Que motivação teria o Procurador-Geral da República para se portar desta forma, por tanto tempo, sem ao menos ouvir os principais interessados pela verdade de suas investigações? Por que não poderia o Ministério Público, antes mesmo de atender aos rigores do devido processo, antecipar-se com naturalidade ao vício do próprio processo? E digo vício, Sr. Presidente, pelo simples fato de que o Ministério Público, ao longo de todo esse tempo, simplesmente desconsiderou a Súmula Vinculante nº 14 do Supremo Tribunal Federal, que garante textualmente:

“É direito do defensor, no interesse do representado, ter acesso amplo aos elementos de prova que, já documentados em procedimento investigatório – e aqui repito eu, procedimento investigatório – realizado por órgão com competência de polícia judiciária, diga respeito ao exercício do direito de defesa.”

Por mais que o Ministério Público alegue que ainda não se tratava de um inquérito, ou mesmo de um procedimento investigatório, há de se perguntar então: seria o quê? Se todo este procedimento até aqui promovido pelo Ministério Público, pela Polícia Federal e pela Justiça, não configura um processo ou ato formalizado, por que então o Procurador-Geral solicitou ao Ministro Teori Zavascki o arquivamento de alguns desses processos? Arquivar o que ainda nem existia? Ora, se pediu o arquivamento, é por que existia algum ato, algum procedimento, ainda que apenas investigatório. Mas, mesmo neste caso, ele estaria abrangido pela Súmula Vinculante do Supremo e, portanto, obrigado a conceder o acesso aos autos e o direito de defesa aos interessados, ainda que por meio de uma simples oportunidade de esclarecimentos prévios.

Aliás, Sr. Presidente, este fato do pedido de arquivamento é mais uma ação obscura do Procurador-Geral da República. Como já dito, se não havia inquérito a ser instaurado, de que exatamente ele pediu o arquivamento? Mais grave ainda, por que citar e envolver nomes de pessoas para as quais não se achou, nas suas palavras, indícios suficientes para abertura de inquérito? Por que citar ou fazer referência, por exemplo, ao nome do senador Aécio Neves e de outras seis autoridades se, ele mesmo, o Procurador, não achou nada suficientemente justificável para solicitar o inquérito? Ora, bastava não pedir, não citar, simplesmente desistir, sem envolver aqueles nomes. Mais grave ainda, quando se trata da presidente da República, como foi o caso, juntamente com o ex-presidente Lula, citada por um dos delatores, para os quais sequer o Procurador-Geral pediu arquivamento. Repito: por que citar em seu documento de encaminhamento dos procedimentos ao Supremo o nome da presidenta Dilma Rousseff? E pior, disponibilizar o documento na página da Procuradoria-Geral da República e, mais ainda, em nota oficial de sua Secretaria de Comunicação Social.

Sr. Presidente, Sras. e Srs. Senadores, após a divulgação, na última 6ª feira, da autorização para abertura de inquérito pelo Supremo Tribunal Federal em relação a dezenas de nomes do meio político, cabe aqui registrar – e isso todos devem ter bem claro em mente – que o Ministério Público atuou, até aqui, baseado exclusivamente em depoimentos de notórios contraventores da lei, cuja credibilidade não recomenda, de pronto, a certeza e a pacificação da veracidade das informações. Ainda mais, Sr. Presidente, quando se trata de depoimentos oriundos de delações premiadas que, não raro, são colhidas pelo método das aproximações sucessivas, tentando cobrir lacunas ou unir pontos obscuros de depoimentos anteriores, sempre com a intenção de forçar uma sequência supostamente lógica ou coerente aos acontecimentos, verdadeiros ou não.

Soma-se a isso, a notória precariedade psicológica – e em alguns casos até física – dos filhos da delação, cujos depoimentos aos alumbrados foram feitos durante e após um longo período de encarceramento, em condições de tortura psíquica. Vale lembrar que a Lei 12.850/13, que trata da colaboração premiada, prevê no §1º de seu art. 4º que, “em qualquer caso, a concessão do benefício – no caso, a delação premiada – levará em conta a personalidade do colaborador, a natureza, as circunstâncias, a gravidade e a repercussão social do fato criminoso e a eficácia da colaboração.” Será se essas condicionantes foram, de fato, levadas em conta? E digo isso, Sr. Presidente, a partir também de uma outra clara constatação, para a qual basta reproduzir dispositivo da mesma lei que versa: “São direitos do colaborador: – ou seja, do delator premiado – não ter sua identidade revelada pelos meios de comunicação, nem ser fotografado ou filmado, sem sua prévia autorização por escrito.” (art. 5º, inciso V). Ou ainda, Sr. Presidente, o art. 7º, que diz: “O pedido de homologação do acordo (ou seja, de delação premiada) será sigilosamente distribuído, contendo apenas informações que não possam identificar o colaborador e o seu objeto.” Pergunto, de novo: tudo isso foi respeitado pelo Ministério Público? Houve ou não houve inúmeros vazamentos, obviamente sempre seletivos e distorcidos? Houve ou não houve divulgação de trechos, imagens, áudios, tudo sempre convenientemente com a tendenciosa colaboração dos meios? Que sigilo é este, se vários nomes já eram de domínio público há vários meses? Onde está, novamente, a seriedade, a responsabilidade do Ministério Público? Por que continua o Ministério Público achando que o centro do mundo é a sua sede e que, em nome de seus virtuosos, inquestionáveis e alumbrados integrantes, a ele tudo é autorizado fazer?

Não por acaso o presidente da Associação dos Advogados de São Paulo, Dr. Leonardo Sica, foi direto ao ponto: (abro aspas) “Eu não posso prender uma pessoa e condicionar a liberdade dela a uma delação, isso é absolutamente ilegal. (...) A gente não pode corromper o processo para combater a corrupção.” E disse mais o Dr. Leonardo Sica: “...quando se elegem bodes expiatórios, (e) algumas poucas pessoas são punidas para combater a corrupção no país inteiro, isso é um pouco de Direito Penal do Inimigo.”

A verdade, Sr. Presidente, é que desde o início dessas investigações, o Ministério Público atuou com o claro objetivo de retardar a abertura de inquéritos para evitar a Súmula 14 do Supremo Tribunal Federal, sob alegação do procedimento dito secreto. Isso chega a ser uma agressão. Sonegar de forma absoluta as informações das pessoas citadas definitivamente não se coaduna com o Estado de Direito.

O fato concreto, é que até o momento, o Ministério Público, coadjuvado histericamente pelos meios, criou, em torno da delação premiada, todo um ambiente hostil, uma autêntica panacéia pré-condenatória em que a palavra de um notório contraventor vale mais do que as prerrogativas de um agente investido de mandato parlamentar. Como é possível admitir que a palavra de coagidos detratores da lei serve para abrir inquéritos, sem que nenhuma autoridade tenha tido a oportunidade de esclarecer os pontos levantados pela investigação? No fundo, é uma decisão inserida em um processo, cuja natureza parte do pressuposto do desrespeito deliberado às autoridades constituídas.

Não foi sem motivo, Sr. Presidente, que o próprio juiz Sérgio Moro declarou que delações premiadas devem ser vistas com o devido cuidado. No mesmo sentido ressaltou o Ministro Teori Zavascki: segundo ele, a abertura de inquérito não representa (abro aspas) “juízo antecipado sobre autoria e materialidade do delito, principalmente quando os indícios são fundados em depoimentos colhidos em colaboração premiada. Tais depoimentos não constituem, por si sós, meio de prova, até porque, segundo disposição normativa expressa, nenhuma sentença condenatória será proferida com fundamento apenas nas declarações de agente colaborador (art. 4º, § 16, da Lei 12.850/2013)” (fecho aspas).

Infelizmente, mas como era de se esperar, há toda uma desvirtuação da realidade por parte dos meios, que se encarregaram de tentar convencer a população de que todo e qualquer depoimento oriundo da delação premiada configura uma verdade absoluta, pois, segundo o vago entendimento desses pseudoanalistas midiáticos é de que, se o delator afirma algo, isso se torna inquestionável. O erro, Sr. Presidente, está em partir da premissa de que se o delator afirmou algo é porque ele possui provas, caso contrário ele perderia o benefício da delação premiada. Ora, em nenhum momento a lei dispõe sobre isso. E se assim fosse, um dos dois principais delatores, Paulo Roberto Costa ou Alberto Youssef, já teria perdido essa condição, pois como atesta o próprio Procurador-Geral, houve contradições entre os depoimentos deles. Um exemplo se deu no caso da citação aos presidentes Lula e Dilma Rousseff, no episódio em que um dos delatores afirmou, e o outro desmentiu, de que houve doação para a campanha presidencial de 2010 e que toda a cúpula do Palácio do Planalto teria pleno conhecimento do esquema criminoso na Petrobras. É claro que um dos dois delatores mentiu. Porém, nenhum deles perdeu o benefício. A única disposição da lei próxima a esse sentido faz referência, com obviedade, ao compromisso legal de dizer a verdade (§14 do art. 4º). Porém, como é sabido, a verdade de um não é necessariamente a verdade do outro. Como diz o ditado, para todo fato há sempre três versões: a tua, a dele e a verdadeira. E volto a questionar: que credibilidade e veracidade supremas pode haver nas palavras de notórios contraventores da lei? Qual o limite disso tudo, Sr. Presidente? Aliás, é sempre bom recordar que o próprio Alberto Youssef já quebrou acordo de delação premiada em casos anteriores em que foi também foi envolvido, mais especificamente no caso do Banestado, há alguns anos atrás.

Enfim, Sr. Presidente, Sras. e Srs. Senadores, em prol da transparência pública, agiu corretamente o Ministro Teori Zavascki ao quebrar o suposto sigilo dos inquéritos. Agora, sim, ao ter acesso aos autos, ao conhecer o teor dos depoimentos, todos poderão oferecer os esclarecimentos. Ainda é prematuro, neste momento, entrar no mérito e no conteúdo das peças já disponibilizadas, até porque, na prática da Justiça, listas de nomes sem provas não significam nada. Politicamente, recomenda-se a devida serenidade e prudência que o grave momento institucional requer.

Ao concluir, Sr. Presidente, pelo que constatamos até aqui, mais uma vez só nos resta lamentar a postura parcial e irretratável, frente a todo o processo, de um grupo instalado no Ministério Público e que, oportunamente, passou a influenciar e a ditar a atuação do Procurador-Geral da República. Condutas dessa espécie, sob o manto de um inimaginável poço de virtudes éticas, não fortalecem as instituições, menos ainda amadurecem a democracia.

Era o que tinha a dizer, por enquanto, Sr. Presidente, Sras. e Srs. Senadores.

Muito obrigado.