Decano do STJ critica delações que Moro premia
O Conversa afiada reproduz trecho de entrevista do Ministro Felix Fischer ao site Jota:
Decano do STJ critica uso de delações de chefes contra subordinados
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A lei da delação premiada é muito recente, e ainda não há jurisprudência das cortes superiores sobre o instituto. Quais pontos o senhor considera que podem ensejar maior debate sobre a aplicação da nova lei?
O problema é que a delação não é uma sentença, ela tem que ser bonificada ou ela não tem valor nenhum. A delação tem que ser vista com muito cuidado. Antigamente, quando não havia delação premiada, o Supremo tinha a jurisprudência para a chamada de corréu. Era o sujeito querendo tirar o corpo fora, imputando ao outro, achando que com isso, se condenado, na fixação de pena o juiz levaria em conta, mas não teria uma redução tão grande quanto essa delação premiada. Sem ser premiada, o Supremo ficava com o pé atrás. Sendo premiada, o juiz tem que ser muito cuidadoso porque as consequências são bem maiores do que se for uma delação típica se tudo aquilo for verificado.
A questão são os efeitos práticos dessa delação. Temos que pensar se isso tem sentido jurídico. Um sujeito que não tem importância vital no esquema entregando os demais é uma coisa. Outra é o líder do esquema se beneficiando com a delação. E vamos supor que caia uma hipótese dessa: em um grupo, todos fazem delação premiada. Ninguém será punido?
O senhor acha que caberia uma regulamentação da lei?
Ela está disposta em vários lugares, tem um tipo de delação no Código Penal e tem essas que estão sendo feitas agora. Não sei até que ponto isso não pode causar algum tipo de confusão. Tem que ver com cuidado o efeito do instituto sobre a pena. Uma pessoa que não tem importância nenhuma no esquema terá uma pena alta e o cabeça não?
Faria sentido ter delação premiada apenas para réus não presos?
Em relação ao réu que está preso não poderia ter, né? Às vezes, a pessoa está presa por outros motivos. Vamos supor o sujeito tentou fugir e foi preso, para quê impedir a delação dele? Essas medidas que são muito radicais, que mudam completamente a sistemática têm que ser analisadas com muito cuidado.
O STJ e o Supremo, até o presente momento, apoiaram todos os atos que vieram do Paraná, em relação a Lava Jato. O senhor acha que a operação não correria risco de ser anulada?
Pode ser que eu receba um processo que é caso de nulidade, não dá para adivinharmos. O fato de haver nulidade não quer dizer que houve um equívoco da pessoa que está julgando.
Advogados têm dito que a Lava Jato se tornou um reality show judicial. Haveria, nesse caso, conflito entre o direito à informação do público e o direito de uma investigação e julgamento reservado, sem holofotes?
Acho que a divulgação de detalhes da investigação não está ocorrendo. Nós sabemos que está havendo uma investigação. Os detalhes não estão sendo divulgados, têm casos de quebra de sigilo bancário, o que não pode ser divulgado. Eu acho que é um caso de repercussão em razão dos valores envolvidos e o número de pessoas envolvidas. Isso desperta muita atenção de quem acompanha por jornal.
Acho que o problema maior no nosso sistema é o julgamento ser público. Na maioria dos países, do segundo grau para cima, a deliberação é feita em sala fechada. A transparência é quanto a motivação da decisão. Não é dizer sim ou não, tem que dizer o porquê.
Qual o prejuízo que o senhor vê nos julgamentos abertos?
Fica muito lento. Dependendo do processo, a pessoa quer mostrar que tem conhecimento, faz votos muitos longos. Vemos muitas vezes superposição, por exemplo, o relator falou uma coisa e o outro fala a mesma coisa com outras palavras. Em uma sala fechada, isso não aconteceria. Se o julgamento em público fosse sinal de transparência, como fica o fato de que 80% das decisões são monocráticas na nossa Justiça? O juiz teria que explicar em público a sua decisão. Acho que não é relacionado a transparência, é uma tradição nossa, mas quando o volume de processos é grande, isso atrapalha…e muito.
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