"Brasil vai bater recorde de mortes na pandemia", alerta cientista
O neurocentista Miguel Nicolelis, referência mundial na área, afirmou que o Brasil caminha para se tornar o epicentro da Covid-19 no mundo.
O médico, que é coordenador da Comissão Científica do Consórcio Nordeste, se dedica ao Monitora Covid-19, projeto em que a própria população compartilha seu estado de saúde (por meio de um aplicativo no celular) e, no caso de haver sintomas da doença, recebe atendimento médico.
O sistema, que começou a ser implantado nos nove estados do Nordeste, já está disponível em todo o país.
Para o neurocientista, ao falar sobre a pandemia do novo coronavírus, "vamos alcançar números muito altos, vamos viver algo que nunca imaginamos na história do Brasil".
"O Brasil já está assumindo esse posto [de epicentro da pandemia]. Hoje dividimos esse papel com os Estados Unidos, dois países de dimensões continentais que têm líderes que não souberam lidar com a crise, Trump no início e Bolsonaro ao longo de todo o tempo. Esse nosso patamar de mil mortes por dia vai aumentar. O Brasil ainda vai bater muitos recordes nesta pandemia, no mínimo por duas ou três semanas. Vamos alcançar números muito altos, vamos viver algo que nunca imaginamos na história do Brasil. E isso, nas proporções que vamos ver, não era inevitável. Mesmo regiões que estão sofrendo menos, como o Sul, vão sofrer bastante, de maneira que nunca imaginaram", afirmou em entrevista ao Zero Hora.
Na conversa, Nicolelis alertou para uma segunda onda do vírus após o primeiro surto.
"E costuma ser pior. Esse é um medo. Em países mais isolados fica mais claro o que é primeira e o que é segunda onda, mas, nas grandes nações, como Brasil, China e Estados Unidos, as coisas são mais incontroláveis – justamente pela maneira como as pessoas se deslocam dentro de seus territórios. São esses países que precisariam ter comandos uniformes, presidentes engajados na luta contra o vírus. Se você não tem um comando central que diz claramente o que se deve fazer, baseado em dados científicos, fica muito difícil. Não tem como. É como ir para uma guerra sem um general. A derrota é só uma questão de tempo", esclarece.
Nicolelis critica o governo do presidente Jair Bolsonaro (sem partido) e lamenta que que a pandemia chegou em um momento de retração mundial no invenstimento em ciência e saúde pública.
"A ciência no Brasil já estava em estado terminal. Quando comento com colegas de outros países que houve corte de verba de mais de 40%, ninguém acredita. Mas o drama é mundial, e inclui Estados Unidos e Europa. O sistema público de saúde do Reino Unido, que já foi o melhor do mundo, não está mais nem perto disso devido aos cortes orçamentários. Os britânicos tinham orgulho dele. Foi necessária uma crise sanitária desse tamanho para que se dessem conta do que havia acontecido. Trump desmontou a equipe de detecção e prevenção a pandemias dos Estados Unidos. Logo agora! A lição universal da covid-19 é que ciência e saúde pública têm de ser prioridade", frisa.
Nicolelis também comentou a imagem do Brasil no exterior.
"Horrível. Talvez quem esteja no Brasil não tenha a exata noção, mas a imagem do Brasil lá fora foi derretida. Não temos mais nada pelo que zelar. Já estávamos nesse caminho, e o coronavírus foi a pá de cal. O presidente Bolsonaro foi eleito por todos os grandes jornais europeus e norte-americanos como o inimigo número 1 do combate ao vírus. O Guardian tem um lugar cativo para os absurdos que vêm do Brasil. Agressões a enfermeiros, carreatas pelo fim do isolamento, posts do presidente, quase todos os dias tem algo", conclui.
A entrevista completa está aqui.