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Coronavírus: ou protegemos a todos ou todos estão desprotegidos

Rezende: com ou sem presidente, podemos vencer!
publicado 20/03/2020
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(Reprodução/TV Brasil)

Por Marcos Rezende, historiador, Mestre em Gestão Social pela UFBA, fundador do Coletivo de Entidades Negras (CEN) e Ogã do Ilê Axé Oxumarê - É certo que o Coronavírus (COVID-19) é um dos maiores problemas de saúde mundialmente enfrentados ao longo da história. Um vírus desconhecido e devastador, que matou milhares de pessoas no mundo e que ainda se espalha por muitos países. Os estudos mais imediatos tentam dar conta dos medicamentos mais eficazes no combate ao COVID-19, mas o certo é que a prevenção com a higiene pessoal e o isolamento social são as armas de melhor efeito comprovado.

É certo também que o necessário e imprescindível isolamento social traz consequências outras para a economia e, como reação lógica, ao mercado de trabalho. O Brasil conta com muitos trabalhadores informais (diaristas, ambulantes, entregadores em domicílio, dentre muitos outros) que necessariamente ficarão impedidos de exercer seus ofícios e deixarão de ter renda para a manutenção das necessidades mais básicas. Segundo dados da Pesquisa Nacional por Amostra de Domicílios (Pnad) de 2019, 38,6 milhões de brasileiros trabalham na informalidade.

É indiscutível que estes indivíduos, além de deixarem de movimentar a economia, passarão por dificuldades na manutenção das necessidades mais básicas, a exemplo de compra de alimentos, itens de higiene pessoal, pagamento de aluguel, gás, água, luz, dentre outros. Para além dos trabalhadores informais, os empregados sofrerão cortes salariais em virtude do COVID-19, conforme proposta anunciada pelo Governo Bolsonaro na tentativa de salvar as empresas. Isso sem falar em mais de 158 mil do Bolsa Família cortados durante a crise do Coronavírus (61% no Nordeste), segundo informações do UOL.

Na contramão de outros países que enfrentam a crise do Coronavírus salvaguardando seus cidadãos a partir da isenção de taxas de luz, água e gás para os mais vulneráveis, redução de taxas de juros e injetando dinheiro na economia com a distribuição de cheques e subsídios para a população, como fizeram França e até os EUA do conservador Donald Trump, o Brasil continua a cortar na carne dos trabalhadores.

É certo que o Governo Bolsonaro está afundado em uma crise econômica e institucional que precede o COVID-19. A moeda brasileira entra em desvalorização crescente e o dólar alcança o maior valor desde a implementação do real. As aparições públicas do presidente não apresentam qualquer sinal de luz para os brasileiros e, ao contrário disso, ainda demonstram a dimensão da irresponsabilidade do mesmo em relação ao cuidado com a transmissão do Coronavírus, a exemplo de quando compareceu em manifestação pública após ter tido contato com pessoa contaminada.

As pesquisas demonstram a reprovação da população brasileira à postura do presidente durante a crise do COVID-19. Segundo pesquisa da Atlas Político, divulgada pelo El País em 19/03, a reprovação da gestão de Bolsonaro sobre o Coronavírus é de 64% da população e 45% se dizem a favor do impeachment, tudo que o Brasil não precisa neste momento, mas que o presidente parece insistir para que aconteça.

Noutro giro, Bolsonaro não fez um pronunciamento que direcionasse políticas para as pessoas que se encontram em situação de rua e, consequentemente, ainda mais vulneráveis ao COVID-19. O Brasil não tem sequer dados atuais desta população, mas pesquisas de 2007 e 2008, realizadas pelo extinto Ministério de Desenvolvimento Social, e estudos de 2015, realizados pelo IPEA, já sinalizavam mais de 100 mil pessoas em situação de rua, número que deve ter crescido com o aumento do desemprego e da população brasileira, que já passa de de 210 milhões de habitantes.

Ainda em relação aos segmentos mais vulneráveis, "não se ouviu uma vírgula" sobre a população carcerária. O Brasil tem 758.676 pessoas presas (Infopen/2019), em um sistema que só tem capacidade para comportar 60% deste total. Se tomarmos o exemplo de Bahia, Ceará, Pernambuco, Rio de Janeiro e São Paulo, os 5 estados juntos têm 360 unidades para cumprimento de pena, dos quais apenas 275 contam com consultório médico (informações da Rede Observatório de Segurança Pública). Com superlotação e ausência de unidades médicas, como a vida da população carcerária será preservada?

É importante observar que existe uma maioria negra na população de rua e na população carcerária, o que, não é demais lembrar, é reflexo do racismo que estrutura o Estado Brasileiro e que ganhou força com o governo Bolsonaro e o desmonte das políticas de promoção da Igualdade Racial. É também de maioria negra a população das periferias brasileiras, historicamente vulnerabilizadas e mais impactadas com as dificuldades dos trabalhadores informais e também assalariados durante a crise do Coronavírus.

A impressão que fica é que o Governo Bolsonaro está perdido em meio à crise do COVID-19. Ainda não se compreendeu que, com a contaminação comunitária, que já chegou em estados brasileiros, a exemplo de São Paulo, Rio de Janeiro, Bahia e o próprio Distrito Federal, ou se cuida de todos ou todos estão descuidados. Para um presidente que a todo tempo demonstra seu conservadorismo por meio de posturas racistas, misóginas e classistas, os sinais são de que o povo brasileiro está por sua própria conta na luta contra o COVID-19.

Por isso, precisamos, mais do que nunca, reforçar nossos sentimentos de solidariedade e equilíbrio. Precisamos pensar que todos precisarão de alimentos e de produtos de higiene pessoal (em especial sabonete e álcool gel). Devemos observar que existem serviços essenciais que serão cobertos por profissionais que estarão na linha de frente da exposição ao COVID-19, a exemplo dos profissionais de saúde, garis, guardas, bombeiros e policiais militares, além de trabalhadores de farmácias e supermercados. Estes precisam ter a nossa solidariedade redobrada.

Estaremos juntos na luta contra o Coronavírus e, com ou sem presidente, sairemos vencedores. Vamos proteger a todos!