Dois anos da morte de Marielle. Quem foi o mandante?
Pergunta ainda sem resposta. (Crédito: Fotos Públicas)
Por Igor Carvalho, do Brasil de Fato - Neste sábado (14), a execução da vereadora Marielle Franco (PSOL) e de seu motorista, Anderson Gomes, completa dois anos. Neste período, a apuração do crime avançou em alguns aspectos, mesmo que lentamente. No mapa da investigação, ainda que de forma confusa, milicianos das forças de segurança e políticos do Rio de Janeiro figuram como suspeitos. Uma leitura atenta sobre os nomes divulgados, revela a relação intrínseca dos acusados com a família Bolsonaro.
Desde 14 de março de 2019, o policial reformado Ronnie Lessa e o ex-policial militar Élcio Queiroz estão detidos, acusados de serem os executores de Marielle Franco. No dia 26 de outubro do mesmo ano, em seu último ato à frente da Procuradoria Geral da República (PGR), Raquel Dodge apresentou uma denúncia ao Superior Tribunal de Justiça (STJ) apontando Domingos Inácio Brazão, ex-deputado e conselheiro do Tribunal de Contas do Rio de Janeiro, como mandante do assassinato da vereadora.
Essa primeira informação, da prisão dos suspeitos, já fez o país atentar para a relação entre os milicianos, o assassinato de Marielle Franco e o presidente Jair Bolsonaro (sem partido). Lessa é vizinho do presidente no condomínio Vivendas da Barra, na Barra da Tijuca, zona oeste do Rio de Janeiro. Nas redes sociais, Élcio Queiroz exalta o mandatário brasileiro e expõe fotos com ele.
Federalização
Na mesma ocasião da denúncia contra Brazão, Dodge recomendou que o caso fosse federalizado. Isso significa que a investigação sairia das mãos da Polícia Civil e do Ministério Público do Estado do Rio de Janeiro (MPRJ) e iria para a Polícia Federal (PF). A federalização do processo é uma reivindicação antiga da família de Marielle Franco. Porém, com a chegada Bolsonaro à presidência, os parentes da vereadora mudaram de ideia.
“Acreditamos que [o ministro da Justiça e Segurança Pública] Sérgio Moro contribuirá muito mais se ele permanecer afastado das apurações”, afirmou a família em nota divulgada à imprensa. “O Ministério Público do estado do Rio de Janeiro obteve avanços importantes e por isso somos favoráveis a que a instituição permaneça responsável pela elucidação do caso.”
À época da denúncia de Dodge, o chefe do Departamento Geral de Homicídios e Proteção à Pessoa (DGHPP), o delegado Antônio Ricardo Nunes, responsável pela investigação da Polícia Civil, não descartou a possibilidade de que Brazão seja o mandante do crime. “Essa é uma linha de investigação que nós seguiremos também”, declarou o agente.
É o mandante?
Os investigadores se aproximaram de Domingos Brazão após interceptações feitas pela Polícia Federal no telefone do miliciano Jorge Alberto Moreth, o Beto Bomba. Em diálogo com o vereador Marcello Siciliano (PHS), que ocorreu em 8 de fevereiro de 2019, divulgado pelo UOL, o miliciano afirma que Brazão é o mandante do crime e que teria pago R$ 500 mil pela execução da vereadora.
"Só que o Sr. Brazão veio aqui fazer um pedido para um dos nossos aqui, que fez contato com o pessoal do Escritório do Crime, fora do Adriano [da Nóbrega], sem consentimento do Adriano. Os moleques foram lá, montaram uma cabrazinha, fizeram o trabalho de casa, tudo bonitinho, ba-ba-ba, escoltaram, esperaram, papa-pa, pa-pa-pa pum. Foram lá e tacaram fogo nela [Marielle]", afirma Beto Bomba, na conversa com Siciliano.
Empresário da construção civil e cumprindo seu primeiro mandato na Câmara Municipal do Rio de Janeiro, Marcello Siciliano se elegeu em 2016, com votação expressiva na zona oeste do município, em regiões controladas pelas milícias, como Rio das Pedras.
Em dezembro de 2018, a Câmara Municipal aprovou um projeto de Marcello Siciliano, em parceria com os vereadores Felipe Michel (PSDB) e Inaldo Silva (PRB), que autorizava a Igreja Batista Atitude, na Barra da Tijuca, a construir uma templo novo e maior, que já foi inaugurado. A igreja é frequentada por Michelle Bolsonaro e Jair Bolsonaro, que receberam, inclusive, uma festa de despedida dos fieis quando foram morar em Brasília.
Em relatório da Polícia Federal, o miliciano Rodrigo Jorge Ferreira, o Ferreirinha, que também foi interceptado pela PF, fala sobre a disputa eleitoral na região da Barra da Tijuca como uma possível motivação de Brazão para matar Marielle Franco.
“A mesma análise dá conta de outra disputa territorial: observou-se proximidade entre as zonas eleitorais onde Marielle Franco e Chiquinho Brazão [irmão mais velho de Domingos] obtiveram a maioria de votos”, aponta o relatório. Ainda de acordo com o documento, o conselheiro do TCE é próximo dos milicianos.
Chiquinho Brazão, hoje deputado federal pelo Avante, que é sócio do irmão em uma rede de postos de gasolina, recebeu do governo de Jair Bolsonaro três passaportes diplomáticos, em março de 2019. De acordo com as revelações feitas pelo Brasil de Fato, o benefício foi concedido ao parlamentar, à Dalila Maria de Moraes Brazão, sua esposa, e a João Vitor de Moraes Brazão, seu filho.
Em outro trecho do texto, o delegado da PF Leandro Almada, que assina o relatório, não hesita em apontar o conselheiro do TCE como responsável pela execução. “Domingos Inácio Brazão é, efetivamente, por outros dados e informações que dispomos, o principal suspeito de ser o autor intelectual dos crimes contra Marielle e Anderson.”
Na interceptação telefônica feita pela PF, o miliciano Beto Bomba aponta outros executores para o assassinato de Marielle: Edmilson Gomes Menezes, o Macaquinho, Leonardo Gouveia da Silva, o Mad, e Leonardo Luccas Pereira, o Leléo. O major da Polícia Militar Ronald Alves Pereira teria comandado a operação.
Um mês após a conversa, Ronnie Lessa e Élico Queiroz foram presos no Rio de Janeiro. Para o MPRJ e a Polícia Civil, a dupla é responsável pela execução da vereadora psolista no dia 14 de março de 2018. Os dois negam a autoria do crime, mas seguem presos e irão à júri popular.
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