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Jovens pró e contra o impeachment

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publicado 18/07/2016
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Reprodução: Boitempo

A Editora Boitempo acaba de lançar o livro "Por que gritamos golpe - Para entender o impeachment e a crise política no Brasil". Um dos ensaios desse livro é "Uma sociedade polarizada", de autoria de Pablo Ortellado, Esther Solano e Márcio Moretto. O ensaio começa assim:

"Uma das consequências mais dramáticas do processo de impeachment que o Brasil está passando é a binarização social em dois supostos bandos confrontados, não de adversários e, sim, de inimigos. A academia deve ajudar a sair dessa dialética do inimigo, autoritária, que simplifica os fatos, reproduz estigmas falsos, ataca desqualificando e insultando, não confrontando ideias. Nesse sentido, apresentamos nossa última pesquisa para explicar que a polarização 'coxinhas/petralhas' não corresponde exatamente à situação real na qual se encontra a sociedade brasileira, que é muito mais complexa e não responde às simplificações."

Eu vou conversar com um dos autores desse ensaio e dessa pesquisa, Márcio Moretto.

Márcio, a primeira questão que eu gostaria de submeter a você é relativa à presença de jovens com formação universitária, tanto nos movimentos pro-impeachment, de 12 de abril e 16 de agosto de 2015, e o anti-impeachment na manifestação de 31 de março de 2016. O que você tem a dizer sobre isso?

MÁRCIO MORETTO: Aparentemente, as pesquisas que a gente tem feito nas manifestações indicam que as manifestações em torno do tema do impeachment, seja a favor ou seja contra, elas tenderam a atrair manifestantes mais velhos. Então, pra dar um exemplo, tanto nas manifestações pró quanto anti-impeachment, a maioria das pessoas que foi pra rua tinha mais de 30 anos.

Outras duas manifestações que a gente pesquisou foram uma manifestação em apoio aos secundaristas que ocuparam as escolas em 2015, e uma manifestação daqueles que são a favor da legalização da maconha. E elas indicam um perfil muito mais jovem.

PHA: Portanto, você diria que aqueles que se manifestam contra e a favor do impeachment são mais velhos?

MÁRCIO MORETTO: Aparentemente, o tema do impeachment não tem agregado interesse dessa população mais jovem.

PHA: E com relação ao nível universitário e renda familiar, quem vai às manifestações relativas ao impeachment e quem vai, por exemplo, às manifestações dos secundaristas em São Paulo, e os que são a favor da legalização da maconha?

MÁRCIO MORETTO: No caso de formação escolar, não tem muita diferença. No ato dos secundaristas é claro que tem uma diferença de formação, de acesso à universidade, porque eles são muito mais novos, certo?

Em termos de faixa de renda, é sensível também que na manifestação tanto em apoio aos secundaristas quanto a Marcha da Maconha, elas atraíram um público razoavelmente mais pobre. Na verdade, acho que o mais correto seria dizer que, na população que recebe até três salários mínimos, essas manifestações atraíram mais gente dessa faixa.

PHA: Você diria que os setores jovens, efetivamente jovens, e da periferia, ambos tão numerosos, estão sub-representados em manifestações - pró e contra o impeachment?

MÁRCIO MORETTO: Perfeito, Paulo. Eu acho que é exatamente isso. Você leu bem os dados. Eu acho que, tanto nas manifestações pró quanto contra o impeachment, estão muito sub-representados os jovens e as classes de faixa de renda mais baixa, que são muito numerosos no Brasil.

Reprodução: Boitempo

PHA: Com relação aos partidos políticos - estou me referindo agora às manifestações pró e contra o impeachment. Qual é a posição deles em relação aos partidos? Qual é a fidelidade deles, digamos, em relação ao PSDB e PT?

MÁRCIO MORETTO: Aí tem uma diferença, dos pró- e dos anti-impeachment. No caso dos manifestantes pró-impeachment, existe uma grande insatisfação com o sistema político como um todo. É bem evidente a crise do sistema político nos manifestantes pró-impeachment. Nos manifestantes anti-impeachment, isso não é tão acentuado. Muitos dos manifestantes anti-impeachment acreditam, sim, no sistema político, especialmente no PT e grande parte, também, no PSOL.

PHA: Com relação à imprensa, qual a posição dos dois?

MÁRCIO MORETTO: A gente vê uma coisa invertida. No fundo, todas essas manifestações que a gente estudou, elas todas mostram uma enorme crise institucional, generalizada. Tanto com o sistema político, quanto com a imprensa. Se para os manifestantes pró-impeachment a crise aparece mais no sistema político, nos manifestantes anti-impeachment, essa crise aparece mais em relação à imprensa. Eles são muito céticos em relação à imprensa.

Já nos outros dois atos que a gente menciona no texto, que seriam a Marcha da Maconha e o ato em apoio aos secundaristas, a crise aparece dos dois lados. Então são manifestantes que são, ao mesmo tempo, muito céticos em relação ao sistema político, e também muito céticos em relação à imprensa, à grande imprensa como um todo.

PHA: Vocês também trabalharam com a questão dos partidos políticos e, digamos, o legado social do PT. Você diz, por exemplo, que tanto os participantes da Marcha da Maconha quanto os secundaristas mostram grande adesão às duas afirmações: primeiro, que o PT é um partido corrupto, e, depois, que é um partido que permitiu conquistas na área social, como Bolsa Família, o FIES e o Minha Casa Minha Vida. Como é que é possível conciliar essas duas posições?

MÁRCIO MORETTO: É curioso, né? No ato dos secundaristas isso estava muito forte. Na Marcha da Maconha, eles tinham um pouco mais de dificuldade para aceitar esses ganhos sociais do governo do PT. No ato dos secundaristas, isso era bem nítido. Ao mesmo tempo em que eles acreditavam que o PT era um partido corrupto, tinham (realizado) ganhos sociais importantes. Quem associou que não tem como ter ganhos sociais e ter corrupção ao mesmo tempo foram setores da sociedade que não estão associados com esses grupos que estavam se manifestando. Eu acho que, de um lado, a gente teve ganhos sociais e, de outro, a gente tem alguns indícios claros de corrupção no PT. Eu não vejo uma contradição nisso, de nenhuma forma.

PHA: Vocês também localizaram o que vocês chamam de dois "clusters" diferentes de mobilização, razoavelmente separados: aqueles que tratam do impeachment e o "cluster" dos estudantes secundaristas e da Marcha da Maconha, a favor da legalização da maconha. Não há uma sobreposição entre esses dois "clusters"?

MÁRCIO MORETTO: Existe uma clara diferença entre os manifestantes pró-impeachment e o resto, certo? Agora, desse resto, que seriam os manifestantes tanto contra o impeachment, quanto a Marcha da Maconha etc., eles têm uma grande sobreposição. Mas eu imagino que dá pra enxergar, sim, uma diferença entre esses grupos que estão se manifestando por razões independentes do impeachment e os grupos que estão se manifestando contra o impeachment.

PHA: Na conclusão, vocês chegam à tese de que há uma baixa confiança nas instituições, nos partidos políticos e na imprensa, denunciam redes de corrupção, as artimanhas de poder ilegítimo. E vocês falam de uma anomalia política que dá espaço fértil para desenvolver uma solução autoritária. Você tem medo de um tirano, de um Berlusconi, de um fenômeno desse tipo diante dessa anomalia ou dessa descrença que você localiza nas pesquisas?

MÁRCIO MORETTO: Tipicamente, o que se observa nesses momentos de crise é que existem duas possibilidades, duas saídas mais comuns. De um lado, você pode buscar mais democracia e pedir mais participação popular. E, de outro lado, você pode pedir soluções mais autoritárias. E não está muito claro qual é a saída que a gente está aventando agora. O que está bem claro é que a gente está num momento de crise intensa, com uma polarização intensa, e essa crise atinge tanto os partidos políticos quanto a imprensa.

PHA: Eu conversei com Márcio Moretto Ribeiro, que é doutor em Ciências da Computação pelo Instituto de Matemática e Estatística da USP, professor de sistemas da informação da Escola de Artes, Ciências e Humanidades da USP e membro do Grupo de Políticas Públicas em Acesso à Informação. É isso?

MÁRCIO MORETTO: Isso!

PHA: Que idade você tem, Márcio?

MÁRCIO MORETTO: Eu tenho 32 anos.