Quando a esquerda briga, a direita faz a festa
O Conversa Afiada reproduz do DCM artigo do ex-Ministro da Justiça Eugênio Aragão:
O golpe e o longo processo de deterioração da institucionalidade que o acompanha vem tocando a todos nós de forma intensa. Todos estamos em sofrimento. Quem tem consciência, discernimento e sobretudo conhecimento dos pormenores da sordidez das ações criminosas contra o país protagonizadas por um bando de oportunistas ambiciosos e gananciosos sofre muito. Conhecer nos faz sangrar.
Cada um reage a seu modo. Alguns precisam espernear, outros se recolhem e choram sozinhos. Muitos estão perdidos e buscam o sentido das coisas pelo exemplo da conduta e da opinião de atores de esquerda com maior visibilidade. Outro tanto vê chifre em cabeça de cavalo: pretende ver urdiduras e conspirações por todo lado, acabando, não raro, por disparar, no auge da paranoia, fogo amigo nas próprias hostes.
É parte da missão do golpe deixar a esquerda em polvorosa, que nem barata tonta, perdida no tiroteio interno. Quando a esquerda briga, a direita faz a festa e, como se não bastasse o desgaste naturalmente sofrido pelas porradas midiáticas diuturnas, ainda se dá motivos para os golpistas festejarem a incapacidade das forças antigolpe de se aglutinarem e mobilizarem.
Muito de nossa derrota na arena política se deve a isso: nossa incrível inépcia para distinguir entre a unidade essencial e a divergência por questões periféricas. Vimos em pleno golpe atores sedizentes de esquerda atacarem Lula e Dilma, como se seus inimigos não fossem a direita usurpadora do espaço democrático, mas, sim, a esquerda governista.
Agora continuamos nisso: o Duplo-Expresso a promover ataques pessoais aos deputados Paulo Pimenta e Wadih Damous, como se fossem piores que Bolsonaro, Janot e o MBL! Pior: atacam outros blogs de esquerda, comprometendo a qualidade de nossa comunicação.
Passaram a distribuir sarrafos também em Fernando Haddad, numa fúria inexplicável. É legítimo indagar, por isso, se ainda estão no mesmo barco ou se o abandonaram por delírio ou por razões outras que não estão muito claras. O fogo tem que cessar já, sob pena de serem vistos, os protagonistas do Duplo-Expresso, não como jornalistas, mas como uma dupla de inconsequentes pistoleiros políticos a fazerem o jogo da direita fascista.
E não adianta quererem se escorar em meu depoimento, este não foi dado a seu programa para desqualificar o trabalho parlamentar fundamental de Wadih Damous e Paulo Pimenta.
Vou avisando: estou fora dessa briga de Romulus e Wellington e vejo com enorme tristeza os tiros contra companheiros neste momento crucial da vida nacional, quando nosso objetivo comum deveria ser derrubar o golpe e garantir a candidatura de Lula à presidência da república. Estamos desperdiçando energia e fazendo papel de idiotas perante os fascistas.
Há vida após o golpe e temos que nos preparar para vivê-la, com esforço redobrado de organizar futuras gerações para um embate que não acaba amanhã, mas perdurará por anos e anos a fio, mesmo que eventualmente consigamos manter Lula candidato e fazê-lo vencer as eleições.
Há trabalho por fazer. Vamos nos disciplinar. Paulo Pimenta e Wadih Damous são guerreiros indispensáveis à luta dos que querem um Brasil melhor. Somos poucos e precisamos de todos. Dispersar por conta de brigas de ego é prestar um desserviço ao país.
Convenhamos: tanto faz qual documento trai as intenções da turba da Lava-Jato. Eles estão pouco se lixando. O golpe é escancarado e ninguém pode ter dúvidas sobre a má fé na metodologia adotada para a coleta de “elementos de convicção” contra Lula e o PT.
Eles não sairão abalados com isso. Somos nós que estamos a nos abalar. Não há bala de prata contra a Lava-Jato. Sua derrota dependerá de nossa capacidade de mobilizar e isso não se torna mais fácil com brigas intestinais.
Caiamos na real. Estamos perdendo e perdendo feio. Dissemos que o golpe não passaria e passou. Dissemos que a condenação de Lula não ocorreria e ocorreu. Dissemos que o TRF da 4ª Região não ousaria confrontar as massas coonestando a condenação partidária de Moro e ousou.
Pensávamos que o STJ daria um freio de arrumação e não deu. Estamos torcendo para que o STF cumpra seu papel e garanta a presunção de inocência de Lula e… E estamos brigando entre nós!!!!
Conclamo, por isso, os companheiros do Duplo-Expresso a baixarem as armas nessa arenga fratricida e a se concentrarem no que importa: resistir e mobilizar, pois de outro modo nada disso que fizemos desde 2016 terá valido para algo. Não joguemos fora nossa luta. Temos responsabilidade com o Brasil, com nossxs filhxs e nossxs netxs! Nunca um cachimbo da paz foi tão necessário!