Ricupero, exclusivo para o C Af: Bolsonaro na ONU confirmou o que de pior se poderia imaginar!
Rubens Ricupero, diplomata, ex-ministro da Fazenda e embaixador do Brasil nos Estados Unidos em duas oportunidades (1974-1977 e 1991-1993), demonstra intensa preocupação com as consequências do discurso de Jair Bolsonaro na Assembleia Geral das Nações Unidas, em Nova York.
"O impacto que isso terá para a imagem do Brasil e, mais do que isso, para os interesses políticos e econômicos do Brasil, será seguramente muito negativo. Porque ele [Bolsonaro], como se diz quando o Papa fala "Urbi et Orbi", falou para o mundo inteiro, falou da maior tribuna do mundo e confirmou o que se dizia de pior dele", afirmou Ricupero em entrevista exclusiva para o Conversa Afiada nesta quarta-feira 25.
Para Ricupero, Bolsonaro, além da verborragia ideológica, ainda fugiu do principal item da pauta nas Nações Unidas.
"Ele foi lá e fez apologia dos governos militares, não falou nada do tema central da Assembleia, que é a mudança climática por efeito da ação humana, mostrou que defende posições retrógradas sobre os indígenas, agrediu um número enorme de países, agrediu a própria ONU. Então ele confirmou o que de pior se poderia imaginar. Eu, antes da viagem, achei que dificilmente ele poderia piorar a própria imagem, porque ela já estava no fundo do poço, e me enganei, porque, infelizmente, as coisas sempre podem ficar piores do que são", comenta o ex-ministro.
Vale destacar, também, a tese de Ricupero de que o discurso de Bolsonaro na ONU confirmou o papel de "vilão global" do Brasil. Ao Conversa Afiada, o ex-ministro sustenta:
"Até o surgimento do Bolsonaro, o vilão global era o presidente das Filipinas, Rodrigo Duterte, por causa dos assassinatos na luta contra as drogas. Hoje em dia, o Duterte até sumiu da agenda. E o tema pelo qual ele era conhecido não era de apelo universal, como é a destruição da Floresta Amazônica. Hoje em dia, se você olhar, não tem ninguém. Claro que se pode dizer que o Trump ainda é mais criticado. Mas o Trump é o presidente da maior superpotência do mundo. Mesmo que as pessoas não gostem dele, têm medo dos EUA. Enquanto que o Brasil tem esse lado que é detestado no mundo inteiro e não tem poder. Não é um país que cause susto a ninguém. Então fica só o lado da rejeição".
Ricupero revelou, ainda, como o conjunto dos diplomatas brasileiros reagiu ao discurso de Bolsonaro:
"As informações que eu tenho são de que receberam quase com desespero, porque a situação já era muito grave e todos comentam que nunca tinham imaginado que o Brasil pudesse chegar tão baixo no discurso de um presidente na abertura da ONU. A atitude geral é de consternação, revolta, desesperança, porque os profissionais percebem que isso coloca o Brasil numa postura de rejeição, de um país menosprezado, criticado, detestado mundialmente".
Mas as consequências do desastre de Bolsonaro na ONU não são apenas políticas. Há, também, um aspecto econômico.
"Um pouco antes da viagem dele, houve uma manifestação de 230 fundos de investimento que gerem uma quantia enorme, mais de 10 trilhões de dólares, de 30 países diferentes, e era uma manifestação de preocupação pela destruição da Floresta Amazônica.
Você sabe que manifestações desse tipo nunca acontecem de uma maneira espontânea. Isso ocorre porque há uma pressão dos investidores.
Hoje, nos países ricos, de onde vêm os investimentos, a consciência ambiental se encontra muito mais avançada do que no Brasil. E existem muitos movimentos que boicotam investimentos em países que violam direitos humanos, direitos trabalhistas, a questão do meio ambiente.
Então há uma pressão muito grande para que haja uma lista dos que não podem receber investimento.
E esse manifesto mostrava isso. Isso foi antes de ele ir.
Ele foi e reafirmou tudo isso. Agora o efeito vai ser muito negativo.
Não posso imaginar nenhuma grande empresa internacional que cogite fazer um grande investimento no Brasil. A não ser que faça às escondidas (ninguém vai anunciar uma coisa dessas). Porque a reação vai ser imediata. Vai ser uma reação desfavorável.
Além disso, os dois acordos de livre-comércio que foram assinados pelo Mercosul - um com a União Europeia (UE), outro com a área de livre-comércio da Europa - ao meu ver vão ficar profundamente congelados, numa hibernação por tempo indeterminado. Porque esses acordos teriam que ser submetidos aos parlamentos, para serem aprovados. Ora, não há condições, no momento, ainda mais depois desse discurso, para que qualquer parlamento europeu aprove esses acordos. Ao contrário, a Finlândia, que nesse momento exerce a presidência da UE, chegou até a propor o boicote de compra de carne do Brasil. Então vão se multiplicar casos como esses.
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