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Saturnino: guerra no Rio é uma guerra perdida

E quem financia é o consumidor da zona sul
publicado 05/02/2018
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Conversa Afiada reproduz texto do Correio Saturnino, do ex-senador Saturnino Braga:

A guerra do Rio


Não vou citar números, comparar com outros conflitos armados correntes pelo mundo, para chegar a uma conclusão óbvia: há uma guerra de graves proporções se desenrolando no meu Rio de Janeiro, a cidade símbolo do Brasil.

Uma guerra que é antiga, entre a Polícia Militar e o crime organizado; mas que, a partir dos últimos anos, vem mostrando claramente a incapacidade da Polícia para vencê-la. E, consequentemente, gerando um processo de apavoramento que domina a população da Cidade.

Não culpo a Polícia, seus oficiais, seus soldados, que receberam, na verdade, uma missão impossível: vencer, sozinha, a força crescente de um capital avassalador que domina dois dos maiores e mais poderosos negócios clandestinos do mundo: o tráfico de drogas e o tráfico de armas.

Houve um momento animador que prometeu e até obteve, no início, resultados bastante positivos: foi o da criação da simpática Polícia Pacificadora. Foi explicitamente dito, entretanto, que o projeto só teria êxito ao longo do tempo, se o Estado (Estado ou Prefeitura) cumprisse a sua parte no projeto, que seria a entrada maciça naquelas comunidades dos serviços públicos essenciais para a população mais necessitada.

O Estado falhou e o projeto promissor foi para o brejo. E o crime organizado aproveitou a fraqueza do poder público para não só retomar suas posições anteriores como avançar muito mais profundamente no território que lhe é muito conhecido, que é sua base natural de operação.

A meu juízo, é uma guerra perdida.

Bem, mas não quero ser radical e afirmar puramente que não há saída. E com este propósito, de não afirmar o desastre certo, busco um caminho de vitória, e sou até capaz de encontrá-lo; só que o vejo como um caminho improvável; na verdade, improbabilíssimo: seria o de conseguir secar a fonte de financiamento deste tráfico no Brasil. Não sei a quanto monta este financiamento mas certamente avança muito na conta dos milhões e entra nos bilhões de reais, se considerarmos todo o fluxo no Brasil a cada semana. Arma e droga são coisas muito, muito caras.

E de onde vem este fabuloso financiamento? É uma indagação inocente cuja resposta todo mundo sabe, qualquer um de vocês, leitores, como eu: Vem dos compradores da droga!

E quem são esses compradores? Ora, outra inocente pergunta, todo mundo sabe que vem da nossa classe média. Há, sim, consumidores pobres, mas são relativamente poucos e desses se diz “coitados”, porque acabam morrendo. E o grande contingente, muito mais de noventa por cento deste financiamento, vem desta nossa classe média, que imita os padrões de consumo dos países ricos, até mesmo no hábito da droga. Esta classe média que representa um terço ou mais da nossa população; esta classe média que, em grande parte, talvez mais de metade, não gosta do Brasil, não gosta do seu povo, sonha em morar em Miami; esta classe média que lê O GLOBO e apoia os golpes da CIA, dados para impedir que o Brasil se desvencilhe da dominação e encontre o seu próprio caminho de desenvolvimento; bem, chega de falar mal dela, são brasileiros, têm o direito de pensar como pensam mas, enfim, só quero dizer que este grande financiamento do crime organizado que está matando a Polícia, a Polícia que tanto defende a classe média e muitas vezes espezinha e maltrata o povo pobre, suspeito por ser pobre; esta nossa classe média que consome drogas é que financia a grana preta do lado inimigo nesta guerra que assola o Rio.

E aí? Dito isto, o que fazer?

Campanhas antidrogas pela televisão? Caras, porque televisão cobra caro, mas assim mesmo importantes, prioritárias, sim, se fossem eficazes, se produzissem efeitos importantes na redução das drogas. Será que conseguem?

Bem, tenho minhas dúvidas; entretanto, é preciso tentar, experimentar, pagar marqueteiros caros, tempo de TV ainda mais caro, mas fazer uma tentativa por algum tempo.

Ou então, ou então legalizar as drogas; o Uruguai, nosso vizinho querido, nação moralmente exemplar, adotou esta solução, ao que parece com resultados muito bons.

Enfim, eis o que penso; como sempre, digo, não é a verdade, é só o meu pensamento.

Verdade, para mim, sim, é que jogar a Polícia nesta missão impossível que está matando brasileiros tanto quanto uma guerra, é um erro brutal que persiste, é uma covardia, mais que uma insensatez, é uma calamidade que tem de ser estancada.