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Reforma é para baratear o brasileiro

Barrocal: sem a CLT, trabalhador terá que usar o gogó
publicado 11/11/2017
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O Conversa Afiada reproduz trechos de reportagem do excelente repórter André Barrocal no site da Carta Capital sobre a revogação da Lei Áurea, o que, na Espanha, foi um desastre:

Reforma trabalhista entra em vigor para 'baratear' brasileiro


A nova lei trabalhista, assinada em julho pelo presidente Michel Temer, entra em vigor a partir deste sábado 11. É a mais profunda mudança no mercado de trabalho no País após oito décadas do legado de Getúlio Vargas, o criador da carteira profissional (1932), da Justiça do Trabalho (1941) e da CLT (1943).

As condições de vida e trabalho dos brasileiros têm tudo para piorar, enquanto são duvidosos os efeitos na abertura de vagas, grande justificativa governista e empresarial para a reforma. E para complicar as coisas, é certo que haverá uma batalha nos tribunais.

“A lei 13.467/2016 é ilegítima, nos sentidos formal e material”, diz a Associação Nacional dos Magistrados do Trabalho (Anamatra), prenúncio de guerra nos tribunais.

A afirmação faz parte de um pacote de 125 enunciados aprovado em outubro pela entidade, na II Jornada do Direito Material e Processual do Trabalho, a reunir em Brasília cerca de 600 juízes, advogados trabalhistas e fiscais do trabalho. Uma espécie de roteiro crítico à nova lei, a servir de orientação para togados trabalhistas usarem em processos daqui para a frente.

Um dos enunciados sugere que o trabalho intermitente indiscriminado não deve ser aceito pelos juízes. Esse tipo de trabalho é uma das novidades da reforma. A pessoa fica à disposição do patrão mas só ganha pelas horas de serviço em si. Situação parecida com a do emprego home office, outra novidade, em que o expediente é de casa e com regras que impedem caracterizar vínculo com o contratante, para protegê-lo de processos.

Nos dois casos, para arrancar algo parecido com férias, 13o proporcional, FGTS, INSS, o brasileiro terá de ser bom de gogó, não terá a seu lado as garantias da carteira profissional e da CLT.

Outra novidade é a jornada de trabalho de 12 horas por dia, desde que com descanso de 36 horas em seguida. Segundo os enunciados da Anamatra, essa jornada não pode ser negociada individualmente, apenas via sindicato.

Terceirização total no setor público é outra inovação que os enunciados dizem que não pode ser aceita. E por aí vai.

“O Código de Processo Civil levou cinco anos de debates para ser alterado e a reforma, só alguns meses (sete, entre o envio do projeto pelo governo e a sanção da lei por Temer). O resultado foi uma lei ruim, com muitas deficiências, lacunas, inconstitucionalidades”, afirma o presidente da Anamatra, Guilherme Guimarães Feliciano. “Não sei se haverá mais juízes com os enunciados ou com a lei, mas certamente a lei vai parar no STF, a sociedade tem que ter paciência. Podemos levar até cinco anos para o assunto ser pacificado.”

No Supremo Tribunal Federal (STF), há quem tenha visão parecida com a da Anamatra. É o caso de Ricardo Lewandowski, que deve ter deixado horrorizada uma plateia montada pelo Sindicato das Empresas de Transporte de Passageiros de Belo Horizonte, durante uma palestra em 4 de agosto sobre a reforma.

Para ele, permitir que acordo valha mais do que a lei, como faz a reforma, é deixar o trabalhador “à mercê dos efeitos perversos do capitalismo selvagem”, como nos tempos da Revolução Industrial no século XIX. Direitos como greve, jornada de trabalho limitada, salário mínimo, sindicalização, proteção à mulher e ao menor “não foram estabelecidos a partir de uma lógica apenas econômica, ou de mercado, mas para equilibrar a relação assimétrica entre o capital e o trabalho”.

Ao encerrar o discurso, Lewandowski deixou algumas perguntas. Por exemplo: a nova lei é compatível com um dos objetivos do País descrito na Constituição, o de “erradicar a pobreza a marginalização e reduzir as desigualdades sociais e regionais”?