Mino, o BBB, as cotas e negros de alma branca
O Conversa Afiada tem o prazer de publicar excelente artigo de Mino Carta na edição da Carta que chega nesta sexta-feira às bancas.
É uma aula sobre a mídia nativa (aqui, tratada de o PiG (*) ) e a subdemocracia em que vivemos - ou a treva, para usar expressão dele.
Mino trata, com a usual maestria, da relação entre negros de alma branca, o racismo e a oposição às cotas.
É por aí que o Mino fere a Globo - e o Big Brothel Brasil.
O estupro, o edredon - isso é secundário.
Este ansioso blogueiro fez o mesmo em relação a Ali Kamel - inimigo feroz das cotas - e a Herraldo Pereira e mereceu uma multiplicidade de processos por ... racismo, com a assistência indispensável de Gilmar Dantas (**).
Mino, que se prepare.
A Globo e Gilmar vão para cima de você.
E terei essa honrosa companhia.
E que fique bem claro: cotas evitam o racismo; ser contra as cotas é estimular o racismo.
Ser contra as cotas é requisito para se tornar repórter da Globo?
Ou o Ali Kamel é menos trevoso - como diz o Mino - que o Boninho ?
Ponto e basta !
Ou neste ambiente de trevas só a Globo pode ter opiniões ?
Não é isso, Mino ?
Eis a aula magna:
A serviço da treva
Âncora do Jornal Nacional da Globo, William Bonner espera ser assistido por um cidadão o mais possível parecido com Homer Simpson, aquele beócio americano. Arrisco-me a crer que Pedro Bial, âncora do Big Brother, espere a audiência da classe média nativa. Ou por outra, ele apostaria desabridamente no Brasil, ao contrário do colega do JN. Se assim for, receio que não se engane.
Houve nos últimos tempos progressos em termos de inclusão social de sorte a sugerir aos sedentos por frases feitas o surgimento de uma “nova classe média”. Não ouso aconselhar-me com meus carentes botões a respeito da validade dos critérios pelos quais alguém saído da pobreza se torna pequeno burguês. Tanto eles quanto eu sabemos que para atingir certos níveis no Brasil de hoje basta alcançar uma renda familiar de cerca de 3 mil reais, ou possuir celular e microcomputador.
Tampouco pergunto aos botões o que há de “médio” neste gênero de situações econômicas entre quem ganha salário mínimo, e até menos, e, digamos, os donos de apartamentos de mil metros quadrados de construção, e mais ainda. Poupo-os e poupo-me. Que venha a inclusão, e que se aprofunde, mas est modus in rebus. Se, de um lado, o desequilíbrio social ainda é espantoso, do outro cabe discutir o que significa exatamente figurar nesta ou naquela classe. Quer dizer, que implicações acarreta, ou deveria acarretar.
Aí está uma das peculiaridades do País, a par do egoísmo feroz da chamada elite, da ausência de um verdadeiro Estado de Bem-Estar Social etc. etc. Insisto em um tema recorrente neste espaço, o fato de que os efeitos da revolução burguesa de 1789 não transpuseram a barreira dos Pireneus e não chegaram até nós. E não chegou à percepção de consequências de outros momentos históricos também importantes. Por exemplo. Alastrou-se a crença no irremediável fracasso do dito socialismo real. Ocorre, porém, que a presença do império soviético condicionou o mundo décadas a fio, fortaleceu a esquerda ocidental e gerou mudanças profundas e benéficas, sublinho benéficas, em matéria de inclusão social. No período, muitos anéis desprenderam-se de inúmeros dedos graúdos.
A ampliação da nossa “classe média”, ou seja, a razoável multiplicação dos consumidores, é benfazeja do ponto de vista estritamente econômico, mas cultural não é, pelo menos por enquanto, ao contrário do que se deu nos países europeus e nos Estados Unidos depois da Revolução Francesa. De vários ângulos, ainda estacionamos na Idade Média e não nos faltam os castelões e os servos da gleba, e quem se julga cidadão acredita nos editoriais dos jornalões, nas invenções de Veja, no noticiário do Jornal Nacional. Ah, sim, muitos assistem ao Big Brother.
Estes não sabem da sua própria terra e dos seus patrícios, neste país de uma classe média que não está no meio e passivamente digere versões e encenações midiáticas. Desde as colunas sociais há mais de um século extintas pela imprensa do mundo contemporâneo até programas como Mulheres Ricas, da TV Bandeirantes. Ali as damas protagonistas substituíram a Coca e o Guaraná pelo champanhe Cristal. Quanto ao Big Brother, é de fonte excelente a informação de que a produção queria um “negro bem-sucedido”, crítico das cotas previstas pelas políticas de ação afirmativa contra o racismo. Submetido no ar a uma veloz sabatina no dia da estreia, Daniel Echaniz, o negro desejado, declarou-se contrário às cotas e ganhou as palmas febris dos parceiros brancos e do âncora Pedro Bial.
A Globo, em todas as suas manifestações, condena as cotas e não hesita em estender sua oposição às telenovelas e até ao Big Brother. E não é que este Daniel, talvez negro da alma branca, é expulso do programa do nosso inefável Bial? Por não ter cumprido algum procedimento-padrão, como a emissora comunica, de fato acusado de estuprar supostamente uma colega de aventura global, como a concorrência divulga. Há quem se preocupe com a legislação que no Brasil contempla o específico tema do estupro. Convém, contudo, atentar também para outro aspecto.
A questão das cotas é coisa séria, e quem gostaria de saber mais a respeito, inteire-se com proveito dos trabalhos da GEMAA, coordenados pelo professor João Feres Jr., da Universidade do Estado do Rio de Janeiro: o site deste Grupo de Estudos oferece conteúdo sobre políticas de ação afirmativa contra o racismo. Seria lamentável se Daniel tivesse cometido o crime hediondo. Ainda assim, o programa é altamente representativo do nível cultural da velha e da nova classe média, e nem se fale dos nababos. Já a organização do nosso colega Roberto Marinho e seu Grande Irmão não são menos representativos de uma mídia a serviço da treva. •
(*) Em nenhuma democracia séria do mundo, jornais conservadores, de baixa qualidade técnica e até sensacionalistas, e uma única rede de televisão têm a importância que têm no Brasil. Eles se transformaram num partido político – o PiG, Partido da Imprensa Golpista.
(**) Clique aqui para ver como um eminente colonista (***) do Globo se referiu a Ele. E aqui para ver como outra eminente colonista da GloboNews e da CBN se refere a Ele.
(***) Não tem nada a ver com cólon. São os colonistas do PiG que combateram na milícia para derrubar o presidente Lula e, depois, a presidenta Dilma. E assim se comportarão sempre que um presidente no Brasil, no mundo e na Galáxia tiver origem no trabalho e, não, no capital. O Mino Carta costuma dizer que o Brasil é o único lugar do mundo em que jornalista chama patrão de colega. É esse pessoal aí.