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Barbosa vai aceitar a delação de Jefferson ?

Barbosa, que não aceitou a delação do Pizzolato contra o Gushiken, vai aceitar a delação feita por Jefferson contra Dirceu ??????
publicado 23/08/2012
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O Conversa Afiada reproduz excelente artigo de Wálter Maierovitch da edição desta semana da Carta Capital, de onde se extraiu artigo de Mauricio Dias sobre o moralismo merválico pigânico (*).

Ao Wálter:

A parábola dos cegos.


Na pinacoteca do ‘Museo Nazionale di Capodimonte’ está exposto o famoso quadro do holandês Pieter Bruegel, pintado em 1568 e intitulado a “Parábola dos Cegos”, com a cena do cego a guiar outros cegos. À ação penal 470,  apelidada de Mensalão, foi imposto um ‘iter’ às cegas, incomum, onde a busca do processo justo cedeu lugar à pressa atabalhoada.

No Pretório excelso existem centenas de processos, com matérias relevantes, que aguardam anos para ingressar na pauta de julgamentos. Quanto ao Mensalão, tão logo o relator Joaquim Barbosa concluiu o seu preparo passou-se a forçar o ministro Ricardo Lewandowski a concluir a revisão em prazo determinado. Tudo para colocação em pauta na primeira sessão  pós recesso decorrente das férias forenses de julho.

Infelizmente, não foi levado em conta a inconveniência de se marcar um julgamento de grande impacto midiático em período eleitoral. Onde o processo criminal do Mensalão, com foro privilegiado pela presença de três deputados e não desmembrado referentemente aos 34 demais co-réus,  poderia ser explorado para demonizar partidos políticos e réus. Mais ainda, com a “par condictio” desprezada  no que diz respeito ao desmembrado Mensalão tucano. Frise-se, ainda, a inexistência de urgência, ou melhor, nenhum risco,----pela pena em abstrato tomada pelo máximo----, de extinções de punibilidades de réus por proximidade de prescrições de pretensões punitivas.

Pelo que hoje se percebe, a pressa, --além do fato de Ayres Brito ter algo de relevância histórico-política para marcar a sua curta presidência--, objetivava evitar a perda do voto, pela aposentadoria compulsória em 3 de setembro e 18 de novembro, do ministro Cezar Peluso.  Assim, os ministros, na ausência do revisor Lewandowski, elaboraram um extenuante calendário de sessões. Do calendário ao fatiamento do julgamento, houve um festival de desencontros e de obviedades como, por exemplo, poder cada ministro escolher, no seu voto, a metodologia desejada.

Só que o fatiamento gera, a cada item da proposta de condenação ou absolvição feita pelo relator, manifestações balizadas, limitadas, do revisor e dos demais ministros. O fatiamento, por evidente, prejudica o ‘script’ inicial, ou seja, de o ministro Peluso, --após o relator e o revisor--, antecipar todo o seu voto. A antecipação, ressalte-se, apenas cabe nos casos de não fatiamento do julgamento. Essa inédita antecipação representaria um teratologia lógico-procedimental. No popular, seria como o padre começar a missa pela benção final.

Enquanto os ministros supremos procuram uma bússola para achar o norte, não deve ter passado despercebido da Têmis, -- que é a deusa da Justiça e da coerência--, o voto de Joaquim Barbosa que absolveu, pela fórmula plena da ausência de provas e não pela da insuficiência, o ex-ministro Luiz Gushiken.

A única prova nos autos do Mensalão  a incriminar Gushiken era o relato, na CPI dos Correios, do co-réu Henrique Pizzolatto. Como Barbosa não engoliu a história contada por Pizzolatto sobre os 360 mil, considerado o preço da sua corrupção, foi, coerentemente  desprezada por Barbosa a delação extrajudicial desse co-réu contra Gushiken.

Ensinam os processualistas europeus que para ser aceita a delação do co-réu é necessário total admissão da sua responsabilidade. O co-ré que delata deve concordar com o núcleo central acusatório. Fora isso, o julgador não pode ‘fatiar’ a confissão, tirando a parte que entende verdadeira e excluindo a mendaz. Mais ainda, na célebre lição de Enrique Altavilla, na obra ‘La Psicologia Giudiziaria’: - “ a acusação de co-réu não deve ser uma simples afirmação, antes precisa ser enquadrada numa narração exauriente”.

O famoso Tommaso Buscetta (a pronúncia correta é Bucheta) delatou os chefões da Máfia mas admitiu a sua condição de mafioso e a co-autoria em vários crimes. A isso se chamou Teorema Buscetta, aceito, na sua parte fundamental, pela corte de Cassação da Itália. Quanto a Jefferson, admite haver recebido importância vultosa. Só que escondeu os nomes das pessoas que se beneficiaram com o repasse. Fora isso, ele atacou Dirceu  quando foi mostrado como os seus partidários atuavam nos Correios e para obter propinas Talvez por isso tudo, Jefferson conseguiu se eleger presidente do Partido Trabalhista Brasileiro.

A essa altura e com a costumeira coerência, a Têmis, que nunca usou venda apesar de ter se espalhado o contraio na Idade Média, deve estar com uma pergunta engatilhada: Será que  Barbosa, que não aceitou a delação do Pizzolato contra o Gushiken, vai aceitar como válida a delação feita por Roberto Jefferson contra José Dirceu ??????

Para Dirceu, como insistiu o seu defensor constituído na sustentação oral, a única increpação contra ele e colhida na fase judicial, provém de Jefferson.

-Wálter Fanganiello Maierovich-
Desembargador aposentado, professor de Direito, titular da Academia Paulista de Letras Jurídicas, presidente do Instituto Brasileiro Giovanni Falcone de Ciências Criminais e já professor visitante na Universidade de Georgetown de Washington e de cursos do Conselho Superior da Magistratura da Itália.

(*) Em nenhuma democracia séria do mundo, jornais conservadores, de baixa qualidade técnica e até sensacionalistas, e uma única rede de televisão têm a importância que têm no Brasil. Eles se transformaram num partido político – o PiG, Partido da Imprensa Golpista.