PIG

Você está aqui: Página Inicial / PIG / 2013 / 03 / 25 / Royalties do Globo: Merval volta a ser "jurista"

Royalties do Globo: Merval volta a ser "jurista"

O petroleo é de todos. E não só de quem está perto dele
publicado 25/03/2013
Comments

Amigo navegante ficou muito impressionado com recente colona (*) do Ataulfo Merval de Paiva (**) em defesa dos royalties do petróleo do Rio, posição, que, por acaso, coincide com a do Governo do Rio, onde fica a Globo, e a dos filhos do Roberto Marinho – eles não têm nome próprio.

Como se sabe, a exaltação regionalista liderada por Sérgio Cabral, governador do Rio, é um lamentável equívoco.

Que se sustenta, sobretudo, no apoio da Globo (e do grande constitucionalista Merval de Paiva).

O amigo navegante há de se lembrar que no memorável julgamento do Mensalão (o do PT) – o livro do Paulo Moreira Leite vende mais do que o do Ataulfo -, o Ataulfo teve papel decisivo.

(Clique aqui para ler “Satiagraha: como JB pode fazer a diferença”.)

Ele escalou quem podia votar e quem não podia.

Fixou a agenda.

As datas.

E previu vereditos com a precisão de um carrasco.

Agora, ele pretende votar no Supremo, depois que o Supremo decidiu que quem manda no Executivo e no Legislativo em materia de royalties é o Supremo.

Merval sentou-se na cadeira de Juiz e ditou sentença (no Globo).

O amigo navegante, então, resolveu alinhar alguns comentários que reduzem os argumentos do Merval ao que são: campanha politica.

Diz ele:

1) Royalties em geral

A renda minerária, ou royalty, é uma compensação ou retribuição paga pelo uso de um direito, no caso, a exploração de um recurso natural exaurível.

Os bens minerais, inclusive o petróleo, são da União (artigo 20, IX da Constituição), portanto a renda obtida é uma receita originária da União, não é uma indenização, ou tributo (não é uma receita derivada), porque decorre da exploração do patrimônio do Estado.

O único poder competente para instituir a cobrança de royalties é a União. No entanto, embora a União seja a responsável pela instituição, cobrança e arrecadação, o artigo 20, §1º da Constituição determina a participação dos Estados, Distrito Federal e Municípios, além de órgãos da Administração Direta da União, nos resultados da exploração de petróleo, gás natural e demais recursos minerais ou compensação financeira por essa exploração:

Artigo 20, §1º: “É assegurada, nos termos da lei, aos Estados, ao Distrito Federal e aos Municípios, bem como a órgãos da administração direta da União, participação no resultado da exploração de petróleo ou gás natural, de recursos hídricos para fins de geração de energia elétrica e de outros recursos minerais no respectivo território, plataforma continental, mar territorial ou zona econômica exclusiva, ou compensação financeira por essa exploração”.

No caso da mineração, os Estados e Municípios têm direito a receber parte dos recursos arrecadados com a CFEM (Compensação Financeira pela Exploração de Recursos Minerais) em virtude do artigo 20, §1º da Constituição, mas não têm competência para arrecadar e fiscalizar diretamente as receitas, que são recolhidas pelo DNPM e, posteriormente, repassadas aos entes da Federação. Afinal, a CFEM é
uma receita pública originária da União, não dos entes federados, pois os recursos minerais são bens de domínio da União.


2) Royalties do petróleo

O debate sobre os royalties provenientes da exploração de petróleo e gás natural também é marcado pelos argumentos de cunho regionalista. A lei que criou a Petrobrás (Lei nº 2.004/1953) destinava 4% das receitas arrecadadas como royalties aos Estados em cujo território teria ocorrido esta exploração e 1% aos Municípios. Com a descoberta de petróleo na plataforma continental, o Decreto-Lei nº 523, de 8 de abril de 1969, estendeu a cobrança de royalties para as atividades offshore, mas o valor arrecadado era exclusivo da União, que encaminhava parte para o DNPM e parte para o Ministério da Educação. Para garantir a aprovação da Lei nº 9.478/1997 (a lei que acabou com o monopólio da Petrobrás) no Congresso Nacional, o Fernando Henrique Cardoso concordou com o aumento da participação dos Estados e Municípios nos royalties do petróleo e gás natural, inclusive e especialmente da plataforma continental. Essa confusão, portanto, é mais uma herança maldita do FHC.

O artigo 8º da Lei nº 7.990/1989 (lei dos royalties da mineração em geral) proíbe a utilização dos recursos arrecadados como royalties no pagamento de dívidas ou do quadro permanente de pessoal. No entanto, desde 1999, ocorre a chamada "financeirização das rendas petrolíferas": o governo federal antecipa receita futura dos royalties do petróleo, para o governo do Estado do Rio de Janeiro pagar suas obrigações com a União e capitalizar o fundo de previdência estadual.

O Estado do Rio de Janeiro, deste modo, hipotecou boa parte de suas rendas futuras.

O critério de distribuição dos valores do pagamento dos royalties dopetróleo é exclusivamente territorial, fundado na proximidade física com o local da exploração. As regras estabelecidas dão direito ao recebimento de royalties aos Estados e Municípios confrontantes, ou seja, a distância física é o mais relevante, não a efetiva presença de capitais vinculados ao setor petrolífero.

Não há qualquer avaliação sobre o efetivo impacto econômico e social das atividades petrolíferas sobre o território, muito menos qualquer preocupação com o futuro econômico da região de exploração petrolífera após o esgotamento das jazidas.

Não há nenhum conselho gestor ou fiscalizador, nem a exigência de prestação de contas, ao contrário do que ocorre, por exemplo, na gestão de outros repasses de recursos da União para Estados e Municípios, como nos casos da saúde e da educação. Os royalties pagos aos Estados, Distrito Federal e Municípios como resultado da exploração de petróleo e gás natural ou compensação financeira por essa exploração podem ser, ainda, contestados em virtude desta exploração ocorrer, majoritariamente, na plataforma continental brasileira. A Constituição de 1988 incluiu expressamente os recursos naturais da plataforma continental e da zona econômica exclusiva e o mar territorial como bens da União (artigo 20, V e VI).

Os royalties do petróleo não podem ser compreendidos como uma compensação pela exploração de recursos minerais nos territórios dos Estados, Distrito Federal e Municípios. Afinal, se forem compensação, a partilha dos recursos arrecadados não faria o menor sentido no caso da exploração de petróleo e gás natural na plataforma continental, na zona econômica exclusiva ou no mar territorial, cujos recursos naturais pertencem à União (artigo 20, V e VI da Constituição). Não há razão para que alguns Estados e Municípios recebam recursos em virtude da participação na exploração ou da compensação financeira pela exploração que ocorre em domínio que não é seu, mas da União. Se o artigo 20, §1º da Constituição for interpretado no sentido de que os Estados, Distrito Federal e Municípios têm direito a receber recursos em virtude da participação na exploração ou da compensação financeira pela exploração de petróleo e gás natural em domínio da União, a única alternativa constitucionalmente adequada, em virtude dos artigos 3º, III e 170, VII da Constituição de 1988, que determinam a redução das desigualdades regionais como objetivo da República e princípio conformador da ordem econômica, é a repartição destes recursos entre todos os entes da Federação, e não privilegiar apenas os que se situam geograficamente mais próximos das reservas petrolíferas.

O petróleo é parte da renda nacional, com a vantagem potencial de poder financiar investimentos públicos que sejam parte de uma estratégia de desenvolvimento coerente. O ponto de partida, no entanto, deve ser uma visão de longo prazo do desenvolvimento nacional. Mas nisto ninguém está pensando nesta disputa sobre os royalties.


(*) Não tem nada a ver com cólon. São os colonistas do PiG que combateram na milícia para derrubar o presidente Lula e, depois, a presidenta Dilma. E assim se comportarão sempre que um presidente no Brasil, no mundo e na Galáxia tiver origem no trabalho e, não, no capital. O Mino Carta costuma dizer que o Brasil é o único lugar do mundo em que jornalista chama patrão de colega. É esse pessoal aí.

(**) Até agora, Ataulfo de Paiva era o mais medíocre dos imortais da história da Academia Brasileira de Letras. Tão mediocre, que, ao assumir, o sucessor, José Lins do Rego, rompeu a tradição e, em lugar de exaltar as virtudes do morto, espinafrou sua notoria mediocridade.