Jornalismo não é um exercício de morbidez
Saiu no Tijolaço:
O jornalismo não é um exercício de morbidez
O trabalho da repórter é pífio, metido a engraçadinho e brinca de “beliscar” a ideia de que o Hotel Saint Peter, onde – talvez – o ex-ministro José Dirceu trabalhará no seu regime prisional semiaberto, seja um hotel de luxo (embora, como a própria matéria o registra, esteja bem longe disso). Natural, coisa de alguém que acha que jornalismo é diversão descomprometida e tem as ideias de “matéria de ambiente” que transitam sobre o território da subliteratura.
Mas o editor do site do Estadão não foi apenas fútil como a repórter.
Agiu deliberadamente para “criar” uma impressão de “poder” ao escrever um título – a parte mais lida de qualquer matéria – assumidamente mentiroso.
“Novo trabalho de Dirceu terá vista para a Praça dos Três Poderes“ é a frase que encima a matéria.
Quatro linhas abaixo, a repórter escreve:
“Muito diferente da sala no 4° andar do Palácio do Planalto, com vista livre para a Praça dos Três Poderes, o novo endereço do ex-ministro será um espaço no subsolo do hotel, em um corredor mal iluminado próximo à garagem.”
Não, não foi o chefe deste editor que o mandou fazer isso.
Foi a morbidez que tomou conta de minha profissão.
Já vi muito coleguinha de TV forçando a barra para fazer seu entrevistado chorar, combinando com o cinegrafista.
O ser humano objeto de sua matéria perde essa condição.
Vira algo a ser explorado: lágrimas e “mundo cão” dão “ibope”.
Os condenados estão sendo exibidos como pessoas cheias de regalias, em lugar de ser exibido um sistema cheio de crueldades.
Não choca a ideia de que negros, pobres e anônimos sejam maltratados num presídio, onde, em tese, vão se recuperar de seus descaminhos e regressar ao convívio social.
O chocante é que alguém não seja tratado como um animal, embora recolher-se, todo fim de tarde, a um presídio não seja propriamente a vida de um “rei dos camarotes”.
Mas não basta punir, é preciso maltratar, humilhar, porque a morbidez assim o exige.
E morbidez não é jornalismo.
É doença.
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