O Fascismo é eterno. O Brasil que o diga...
Olá, tudo bem?
Esse podcast é uma tentativa de explicar a natureza do regime político que o povo brasileiro, em eleição livre, escolheu: o fascismo.
Ele é eterno, segundo o mestre italiano Umberto Eco, o filósofo e semiólogo autor de clássicos como "O nome da rosa", "O pêndulo de Foucault", "Número zero", a começar pelo "Tratado de semiótica geral", de 1975.
Eco morreu em Milão, em 2016.
Em abril de 1995 (!) deu uma aula no departamento de estudos italianos e franceses da Universidade de Columbia, em Nova York, reproduzida pela editora La Nave de Teseo, Milão, em 2017.
De onde se extraem - com certa irresponsabilidade - as observações que seguem.
Não será preciso fazer muito esforço para perceber que Eco descrevia, na verdade, o Brasil de hoje.
- O fascismo italiano não tinha uma ideologia. Tinha uma retórica.
- O fascismo italiano foi o primeiro a criar uma liturgia militar, um folclore e um modo de vestir, que fez mais sucesso que Armani, Benetton ou Versace.
- A palavra "fascismo" se tornou uma sinédoque, uma denominação "da parte para o todo": o fascismo italiano continha em si elementos de todos os outros fascismos.
- O fascismo era uma "bagunça organizada", "uma confusão estruturada".
- Apesar disso, é possível fazer uma lista das características típicas do que que vou chamar de "Ur-fascismo", ou "fascismo eterno" (Onde se perceberão traços típicos do bolsonismo vigente - PHA).
1) O culto à tradição - Não se pode permitir o avanço do saber. A verdade já foi anunciada, de uma vez por todas, e não se pode tentar interpretar sua obscura mensagem.
2) Nada de modernismo! - O Ur-fascismo pode ser definido como um "irracionalismo".
3) O irracionalismo depende da ação pela ação! A ação é bela por si mesma. A cultura é suspeita, porque, com ela, vem a reflexão crítica. Como dizia Goebbels: "quando ouço falar de cultura saco a minha pistola".
4) Nenhuma forma de sincretismo pode aceitar a crítica. O espírito crítico opera distinções e distinguir é um sinal de modernidade. Para o Ur-fascismo, o desacordo é uma traição.
5) O Ur-fascismo tem pavor das diferenças. Todo fascista é contra os intrusos. O Ur-fascismo é, por definição, racista.
6) O Ur-fascismo se nutre da frustração individual ou social. Uma das características típicas dos fascismos históricos é apelar às classes médias frustradas. Nesse nosso tempo em que os velhos "proletários" estavam se tornando uma pequena burguesia (e o lumpen se auto-excluiu da cena política), o fascismo encontrará nessa nova maioria o seu auditório.
7) O Ur-fascismo tem a obsessão do complô. Possivelmente o complô internacional (No caso brasileiro em curso, o complô é o da China... - PHA). O fascista se sente sempre assediado. E por isso apela à xenofobia.
8) Os inimigos são ao mesmo tempo muito fortes e muito fracos.
9) Para o Ur-fascismo não é a luta pela vida, mas a vida pela luta. O pacifismo significa curvar-se ao inimigo. A vida é uma guerra permanente. Nenhum líder fascista conseguiu resolveu a contradição: se há uma "solução final", ela cria uma era de paz, uma idade de ouro, o que contradiz o princípio da guerra permanente...
10) O elitismo é um aspecto típico dos fascistas. Eles menosprezam os frágeis. Eles tentam criar um "elitismo de massa".
11) Todos são educados para ser heróis. Na ideologia fascista, o herói não é um ser excepcional, mas é a norma. O culto do heroismo está ligado ao culto da morte. Não por acaso o mote dos falangistas era "Viva a Morte!". O herói fascista também aspira à morte. O herói Ur-fascista é impaciente para morrer: note-se que enquanto não morre faz com que outros morram.
12) Como a guerra permanente e a busca do heroísmo são jogos difíceis de jogar, o Ur-fascista transfere a sua vontade de potência a questões sexuais. É essa a origem do machismo - o que implica em desdenhar as mulheres e a condenação intolerante, da castidade à homossexualidade. O herói Ur-fascista joga com as armas de fogo, que são o seu Ersatz fálico: seus jogos de guerra se tornam uma permanente inveja do pênis.
13) O Ur-fascismo se apóia num "populismo qualitativo". Os indivíduos como indivíduos não têm direitos, e o "povo" é concebido como uma qualidade, uma entidade monolítica que exprime a "vontade comum". Como nenhum quantidade de seres humanos pode ter uma vontade comum, o líder pretende ser o seu intérprete. Assim, o povo não passa de uma encenação teatral. No nosso futuro, esse populismo qualitativo se exercerá na TV ou na internet (nas redes sociais... - PHA), em que a reação emocionada de um grupo selecionado de cidadãos (William Bonner... - PHA) será apresentada e aceita como "a voz do povo".
14) O Ur-fascismo fala a "neolíngua" do George Orwell (Taokei? - PHA). As escolas nazistas e fascistas (todas "sem partido" - PHA) se baseavam num léxico pobre e numa sintaxe elementar para limitar os instrumentos de uma reflexão complexa e crítica. Precisamos aprender a identificar essas formas de "neolíngua", mesmo quando assumem a forma inocente de um talk-show (como o do Bial - PHA).
A conferência de Eco, proferida numa universidade americana, Columbia, se conclui com uma frase do presidente Franklin Roosevelt, de 1938:
"Ouso dizer que se a Democracia americana deixar de progredir como uma força viva, buscando, noite e dia, por meios pacíficos, melhorar as condições de nossos cidadãos, a força do fascismo crescerá em nosso pais."