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Reitor Salles descreve estrago do bloqueio de 30% na UFBA

Só no custeio, R$ 50 milhões! Segurança já começou a falhar!
publicado 10/05/2019
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Reitor Salles: a Universidade é a casa do combate ao preconceito e à ignorância! (Divulgação/UFBA)

PHA: Eu converso com o professor João Carlos Salles, reitor da Universidade Federal da Bahia, uma das vítimas do corte federal aplicado às universidades públicas. Professor João Carlos Salles, qual é a situação da UFBA com esses cortes?

João Carlos Salles: Veja, primeiro nós compreendemos que se trata de um bloqueio; ou seja, foi tornado indisponível um crédito das universidades - de todas as universidades federais, institutos federais. Esse bloqueio certamente atinge muito do nosso custeio, sobretudo. São R$ 49,7 milhões de custeio bloqueados e cerca de R$ 6,2 milhões de investimento, ou seja, aquele recurso que nós utilizamos para comprar equipamentos, para fazer obras. 

Agora, o custeio garante a manutenção, o dia a dia, a segurança, a luz, a limpeza, a vigilância que nós pagamos, portaria etc. Não conseguimos fazer pesquisa, não conseguimos dar boas aulas se não tivermos essas condições mínimas para o trabalho. Então, percebam que, na verdade, é atingida a própria qualidade da Universidade. E os efeitos já se veem, porque os nossos fornecedores, os nossos contratos, às vezes até dentro da margem contratual que obrigaria a manutenção dos serviços, esses fornecedores, assustados com essa possibilidade, já começam a se movimentar, pressionando a Universidade. Tivemos aqui uma paralisação que foi dessa ordem, uma paralisação de um dia. Vamos apurar, porque a empresa não poderia ter feito essa suspensão do trabalho. Eram da segurança, da vigilância, e isso, claro, nos obrigou a tomar medidas precisas para proteger a nossa comunidade. Já conseguimos recompor, mas eu acho que esse gesto da empresa foi motivado pelo próprio anúncio geral do bloqueio, e isso certamente pode se repetir, pode dificultar novas licitações e tal. 

Neste momento, com o bloqueio, nós não temos acesso a certas atividades regulares que deveríamos fazer - novas licitações e até mesmo a previsão orçamentária. Você não pode incluir na sua previsão certas coisas que são garantidas. E lembrar um detalhe: o orçamento das universidades é insuficiente! Em que sentido? Ele tem se mantido até nominalmente, nos últimos anos, mas não faz frente à inflação, não faz frente às repactuações contratuais, não faz frente, inclusive, a alguns gestos que nós precisaríamos fazer para melhorar a qualidade da pesquisa, do nosso ensino e da nossa extensão.

PHA: Agora, esse corte já efetuado, esse bloqueio já efetuado representa quantos por cento do orçamento em curso?

J.C.S.: Do orçamento global, de custeio, seria cerca de 30%. É um baque muito efetivo para a nossa manutenção.

PHA: Eu pergunto uma coisa, professor: quais são os setores acadêmicos mais prejudicados?

J.C.S.: Olha, como o orçamento é anual, digamos que você não tem ainda um impacto mais direto, porque isso vai afetar toda a nossa previsão global, e não o mês a mês agora, neste momento. Então, essa é a diferença. Mas, certamente, nós sabemos que a expectativa já criada causa um certo transtorno. E agora tivemos, recentemente, é bom registrar, um corte excessivo. Foi bloqueado no sistema... isso é efetivamente um corte, porque bolsas desocupadas da Capes deixaram de ser preenchidas. Tivemos 82 bolsas, no caso da Universidade Federal da Bahia, que foram extintas neste momento.

PHA: O senhor pode dar exemplos de pesquisas que estivessem sendo feitas e que foram prejudicados com esse fechamento da Capes?

J.C.S.: Eu não tenho nominalmente algumas pesquisas, mas eu posso dizer que alguns programas que estavam exatamente... programas que tinham concluído um processo de seleção de novos alunos: os alunos antigos deixaram de ter aquela bolsa e os novos pegariam aquelas bolsas. De repente, esses alunos novos não puderam ter bolsa, e isso vai trazer para alguns programas em particular algum dissabor.

PHA: Isso aflige ou prejudica estudantes cotistas?

J.C.S.: Não, no caso não foi dirigido especificamente. Mas eu vou dar um exemplo para você entender bem: o número não é tão significativo se nós notarmos que a UFBA tinha cerca de 1570 bolsas; dessas, 82 foram cortadas da Capes. Então, é um número aparentemente não significativo. Mas, por uma conjunção de acasos, alguns programas não tinham implantado naquele momento, e esses podem ter sido mais prejudicados. Um programa perdeu 13 bolsas, por exemplo, entre Mestrado e Doutorado. Isso é um prejuízo. Além disso, certas bolsas que nós utilizaríamos para medidas para atender especificamente a alunos vulneráveis... Nós tínhamos 13 bolsas separadas na nossa pró-reitoria para atender a alunos em vulnerabilidade, num edital específico, particular... Esse edital já não vai poder mais sair.

PHA: Qual é a reação que o senhor imagina que os professores e alunos possam tomar na UFBA?

J.C.S.: Digamos que essa ameaça à própria gestão da Universidade, à nossa qualidade, teve um efeito positivo, qual seja: uma mobilização da comunidade. Teve uma reação positiva, porque os nossos indicadores se tornaram mais públicos ainda. Os nossos indicadores têm melhorado significativamente...

PHA: Indicadores de qualidade.

J.C.S.: De qualidade! Os indicadores de qualidade se tornaram mais visíveis para a própria sociedade. Teremos agora reações diversas. Parlamentares baianos, a bancada parlamentar baiana vai visitar a Universidade Federal da Bahia na segunda-feira. E nós receberemos os parlamentares juntamente com os outros reitores das universidades federais e institutos federais da Bahia. Então isso, sem dúvida alguma, vai ser um gesto importante de reação da sociedade. 

A sociedade baiana tem reagido, nesse sentido. Ao mesmo tempo, percebemos que há manifestações de ignorância, de desconhecimento que querem nesse momento agredir a Universidade. Temos que reagir. Os professores têm se mobilizado para mostrar aquilo que é óbvio para todos: que a Universidade é um patrimônio, ela é um investimento das nossas gerações no futuro, no desenvolvimento do país, um lugar importante de combate ao atraso, à ignorância, ao preconceito, à violência. E agora acho todos estamos mobilizados para defender esse patrimônio da sociedade.

PHA: Professor, uma última pergunta: o senhor está articulado com os outros reitores de universidades federais brasileiras?

J.C.S.: Sim! Os reitores têm se reunido. A comissão de orçamento da Andifes [Associação Nacional dos Dirigentes das Instituições Federais de Ensino Superior] reuniu-se anteontem e os reitores reunidos lá na comissão de orçamento avaliaram que essa situação, esse bloqueio inviabiliza, sim, as atividades regulares das universidades. A Andifes terá uma audiência com o Ministro dia 16 de maio e vamos colocar objetivamente. Nós temos a obrigação de nos basear em dados concretos, de apresentar números, de apresentar realidades, indicadores. Não se trata apenas de opinião, se trata, de maneira muito bem clara, de estabelecer para o Governo e para a sociedade o que é que está em jogo. E, nesse sentido, é uma questão de responsabilidade de servidor público. Você só pode imaginar que um servidor público queira o bem público, e não apenas por essa ou aquela posição. 

PHA: Professor João Carlos, eu não vou resistir a fazer uma última pergunta: até quando vai o seu mandato? E o senhor não teme não ser reconduzido?

J.C.S.: Veja, eu já fui reconduzido. Então, essa questão não se coloca. Eu estou no segundo mandato e teremos nossa gestão até 2022. 

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