Marco Aurélio: Cunha estupra a Constituição
O ministro Marco Aurélio Mello, do STF, concedeu entrevista à Rádio Gaúcha e ressaltou o atropelamento da Constituição cometido pelo deputado Eduardo Cunha (PMDB-RJ) na votação sobre a redução da maioridade penal.
"A Câmara tem um regimento interno, mas acima dele está a Constituição Federal. E o guarda maior da Constituição é o Supremo Tribunal Federal", declarou o ministro.
“Temos uma regra muito clara que diz que matéria rejeitada ou declarada prejudicada só pode ser apresentada na sessão legislativa seguinte. E nesse espaço de tempo de 48 horas não tivemos duas sessões legislativas. O vício formal salta aos olhos", complementou Marco Aurélio Mello.
Esta não é a primeira vez que Cunha "estupra" a Constituição.
Antes de submeter a redução da maioridade penal a uma segunda votação, sem público nas galerias, o presidente da Câmara já havia feito manobra parecida na votação do financiamento empresarial das campanhas.
Como se sabe, o Cunha é manjado. Ele perde e depois faz uma segunda votação para vencer.
Ouça a íntegra da entrevista de Marco Aurélio Mello:
Em tempo: leia o que diz o Fernando Brito, no Tijolaço:
Mello: “em 48 h não tivemos duas sessões legislativas”. Cunha atropelou a Constituição
“Temos uma regra muito clara que diz que matéria rejeitada ou declarada prejudicada só pode ser apresentada na sessão legislativa seguinte. E nesse espaço de tempo de 48 horas não tivemos duas sessões legislativas. O vício formal salta aos olhos.”
O comentário do Ministro Marco Aurélio Mello à Rádio Gaúcha – em resposta a um comentário idêntico de Joaquim Barbosa, o que aliás seria o mesmo se partido de qualquer estudante de Direito – é o retrato da óbvia fragilidade do golpe perpetrado ontem pelo presidente da Câmara.
Isso é, como diz Mello, salta aos olhos e não tem como prevalecer, apesar de todas as “inovações” do STF.
A entrevista, exceto por esta explicitação do obvio, é muito ruim, nas perguntas e nas respostas. De doer. Nem assim, Eduardo Cunha “passa” na prova.
O mérito da decisão de rebaixamento da maioridade nesta votação espúria, é certo, cairá.
Muito mais grave, porém, é o fato de termos uma Câmara dos Deputados que, por amplíssima maioria – suficiente até para reformas constitucional – despreza a Constituição descaradamente.
O abuso casuísta de Cunha na sessão de ontem tornou aquela Casa, por essa maioria, desprezível a quem defenda a legalidade constitucional.
Quem faz um juramento de respeitar e cumprir a Constituição e escancaradamente o trai, movido pela ânsia autoritária de impor sua posição não tem de responder por isso?
Se houvesse – tomara que haja – deputados sem medo naquela casa, Cunha estaria sendo alvo de um processo de quebra de decoro, ainda que sua maioria e o seu poder sejam grandes o suficiente para engavetá-lo.
Não importa.
É preciso sinalizar que existe uma parte sadia desta Nação que não aceita um tiranete parlamentar, que não se verga diante de sua ousadia e que vai, a cada vez que isso se ensaiar, procurar todos os meios legítimos de barrá-la.
Eduardo Cunha não é parte do jogo democrático; é uma ameaça a ele.
Quando a inconstitucionalidade dos atos de um presidente da Câmara é tão flagrante que se pode aponta-la numa entrevista de rádio e quando, mesmo assim, encontra apoio e tolerância no parlamento para prevalecer, algo precisa ser feito.