Choram com Lula aqueles que resistem ao cinismo!
Lula chega ao cemitério em São Bernardo do Campo onde se despede do neto Arthur neste sábado, 2/III (Reprodução/TV Globo)
O Conversa Afiada tem o prazer de publicar reflexão do jornalista, historiador e ex-deputado federal pelo PT da Bahia Emiliano José:
Walking Around
Morreu o menino.
As hienas, à solta.
Walter Benjamin: civilização e barbárie são uma só coisa.
Marxista da melancolia - disseram-no.
Talvez.
Fez mergulhos na alma.
Monstros - Gramsci falou deles: o que é antigo resiste a morrer, o que é novo não tem forças ainda pra nascer, e nesse interregno aparecem todos os monstros, à vontade para expor toda sua maldade.
Estão à solta, certos de que este é seu tempo - e é.
Acontece que me canso de meus pés e de minhas unhas do meu cabelo e até da minha sombra - Neruda nos encontra cansados.
Acontece que me canso de ser homem -o poeta gritou.
A indignação, a raiva a ferver o sangue, são amortecidas pelo cansaço.
Cansaço de ser homem.
Seria belo ir pelas ruas com uma faca verde e aos gritos até morrer de frio.
Ou matar uma freira com um soco na orelha.
Neruda caminhava irritado.
Os monstros olham para o velho homem cansado mergulhado em lágrimas pela perda do menino e se divertem, experimentam o gozo.
Freud olha de longe e afirma: tudo humano.
A mim sempre me irritou quando alguém se refere à tortura como desumana.
Demasiadamente humana, só os humanos se divertem a torturar - o sadismo é próprio do ser que tomou consciência de si mesmo.
Passeio calmamente com olhos com sapatos com fúria e esquecimento passo atravesso escritórios e lojas ortopédicas e pátios onde há roupa pendurada num arame cuecas toalhas e camisas que choram.
Com Neruda, choramos.
Choramos com Lula, os que não fomos submergidos pelo cinismo, os que sempre estivemos distantes do ódio fascista.
Os que ainda somos paixão - compaixão.
Os que somos irmãos de nossos irmãos -fraternidade.
Os que, ainda que por um átimo acompanhem o poeta e se cansam de ser homem, não esquecem nunca: as trevas são sempre vencidas pela luz solar.
Os que têm consciência de que se há monstros capazes de querer matar o rei Arthur muitas vezes, há muitos outros empenhados em lutar por um mundo em que sejamos irmãos dos nossos irmãos. Sem nunca desistir.
Pelear sempre!