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Dino: é preciso evitar desastre de graves proporções

Se o mandato presidencial pode ser violado assim, até os empresários estão inseguros
publicado 18/04/2016
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Nessa segunda-feira (18/abril), o Conversa Afiada conversou por telefone com o Governador do Maranhão, Flavio Dino, do PCdoB.


Paulo Henrique Amorim - Como explicar esse resultado de 367 x 137, ontem, na Câmara?
Flavio Dino - Houve uma reunião de forças bastante poderosas do grande capital, forças sociais e políticas interessadas no retrocesso. Não conseguindo isso através das urnas, que é o caminho legítimo, acabaram por trilhar essa estrada tortuosa do golpismo e da violação daquilo que a Constituição prevê. Infelizmente, é algo que acontece de tempos em tempos na nossa atribulada vida republicana. Nós achávamos que isso havia saído de moda após o desastre da longa noite da Ditadura militar. E, infelizmente, vimos que não. Essa estratégia de chegar ao poder pela ruptura da via constitucional e democrática continua bastante atual na cabeça de uma parte da elite brasileira.


O senhor acha que o resultado no Senado pode ser diferente e o governo da presidenta Dilma sobreviver no Senado?
É claro que as condições são bastante difíceis, mas creio que é não só um direito - como um dever - que a presidenta Dilma tem, e todos os democratas, de continuarem coerentemente sustentando a legalidade democrática e o respeito à Constituição. Falei com a presidenta Dilma hoje pela manhã e a minha posição pessoal é que ela prossiga na defesa da causa correta, de que não houve nenhum crime de responsabilidade e, por isso mesmo, não é possível levar adiante qualquer processo de impeachment. E me comprometi a continuar a dar sustentação política e o meu apoio jurídico, porque realmente é algo inusitado. Na história do Presidencialismo no mundo jamais se assistiu a um processo tão equivocado por um crime de responsabilidade absolutamente inexistente. Acho que a presidenta deve seguir na defesa, tanto no Senado quanto no Supremo Tribunal Federal.


Existe um grupo de políticos e autoridades ligadas à presidenta Dilma que sugere que ela renuncie e faça um acordo para antecipar as eleições. O que o senhor acha dessa ideia ? (Ler post “PT deve ir para a eleição em 2018”)
Isso só seria possível mediante um amplo entendimento nacional, por todas as forças políticas. Acho que, do ponto de vista constitucional, seria necessário que isso valesse para todos. Como, aliás, é no Parlamentarismo. Quando há uma situação anômala como essa - uma espécie de voto de desconfiança, na prática, que foi votado na Câmara - porque ninguém debateu o crime de responsabilidade na sessão. Haveria, por conseguinte, também a dissolução do próprio Parlamento. É assim no Parlamentarismo. Então para ser coerente com esse absurdo, só seria possível repará-lo mediante eleições gerais. E isso exigiria um acordo pleno, de todas as forças. Me parece um caminho bastante difícil, de difícil execução.


O senhor acha que essas forças que derrotaram o Governo ontem, diante da dificuldade de serem eleitas pelo voto popular, podem tentar montar o sistema de Parlamentarismo no Brasil, já? (Ler post “Eleição já = Parlamentarismo”)
Acho que diante do que a Nação assistiu, horrorizada, na sessão da Câmara, tenho impressão não é uma tese que vá ter muita simpatia popular. De modo que me parece muito difícil trilhar esse caminho, porque nós teríamos, inclusive, que chancelar essa alternativa mediante um plebiscito. Porque a opção pelo Presidencialismo foi adotada no plebiscito emanado diretamente da Constituição de 1988, que determinou que em 1993 o povo deliberaria acerca de qual sistema de governo mais indicado. Houve o plebiscito e a imensa maioria dos brasileiros optou pelo Presidencialismo.

Acho que tanto essa tese, do possível Parlamentarismo, quanto a de supostas eleições gerais, exigiriam uma premissa: que todas as forças políticas pactuassem isso. E me parece muito difícil, porque os golpistas se sentem equivocadamente vencedores. Quando, na verdade, vencida foi a Nação. O que virá em seguida, de continuidade desse quadro lamentável, irá infelizmente atingir a todos. Eu tenho insistido nessa tese do diálogo nacional. Pode ser que das trevas, da escuridão, nasça a luz.


Dessa sua conversa com a Presidenta hoje, o senhor extraiu - se é possível revelar - alguma decisão dela sobre o que fazer agora?
Tanto na conversa por telefone que eu tive com ela, quanto na reunião que ela teve com a bancada do nosso partido (PCdoB) na Câmara, ela reiterou a determinação de proceder a defesa da legalidade democrática e do mandato constitucional que ela conquistou nas urnas. E me parece que esse é o caminho mais correto, o caminho mais adequado. Até para que, perante a opinião pública nacional e internacional, e perante o tribunal da História, fique patenteada e sublinhada a dimensão da violência inconstitucional que infelizmente estão tentando perpetrar nesse momento.


E essa acusação que faz parte da denúncia da oposição - essa denúncia do jurista Miguel Reale Junior - de que as pedaladas formam crime de responsabilidade... O senhor, como Governador, diria o que dessa premissa de que pedalada é crime?
Primeiro, que há bastante tempo esses instrumentos de execução orçamentária e de operações que são feitas ao longo do ano fiscal acabam por ser utilizadas. Então, a presidenta Dilma não foi a primeira que utilizou esses caminhos. Governantes, inclusive em nível estadual, também já recorreram a esses instrumentos. Há vastos estudos quanto isso. Assim como também antecessores da presidenta Dilma. Isso torna o processo ainda mais surpreendente, porque seria de se imaginar, portanto, na linha do que ontem foi equivocadamente chancelado na Câmara, nós teríamos que ter agora processos por crime de responsabilidade contra dezenas de pessoas, ações de improbidade administrativa - porque isso é imprescritível - contra presidentes da República.

Eu fico muito curioso de saber se as instâncias de controle, como o Ministério Público, vão em busca dessa responsabilização, por exemplo, por ato de improbidade administrativa. Acho que isso serve também para demonstrar o quanto é inconsistente isso tudo, e afronta muito visceralmente qualquer consciência jurídica e democrática, inclusive porque há uma desproporcionalidade nisso tudo.

É como se diante de um acidente de trânsito se pretendesse aplicar a pena de morte. Essa assimetria inclusive agride o conceito de crime responsabilidade que está contido na Constituição. De modo que apenas lesões muito graves ao texto constitucional podem ensejar processo de crime de responsabilidade. E não um debate de natureza puramente contábil, que sequer é novo. Então há nisso tudo uma nota inequívoca de surrealismo.


O que acha que será - ou seria - um governo do presidente Temer? O que acontecerá no Brasil?
Esgotada essa fase no Senado e no Supremo, é claro que o vice-presidente Michel Temer vai procurar formar o seu governo através das forças que o apoiaram. E isso é o que me preocupa, porque evidentemente essas forças que planejaram e intentaram esse Golpe de Estado têm um programa. E esse programa tem medidas a serem apresentadas à Nação. E o que vem se debatendo até aqui são propostas em sentido contrário àquilo que a população precisa, que é a extensão de serviços públicos, a manutenção de políticas sociais. Eu tenho ouvido basicamente teses da restrição de direitos, de passos atrás, no que se refere a políticas sociais. A tese do Estado Mínimo, tão fora de moda nos países de capitalismo central, aparentemente ela é muito adorada anacronicamente por aqueles que sustentam esse hipotético governo.

De modo que eu vejo com muita preocupação, porque acho que é preciso continuar avançando em direção à justiça social, ao crescimento com distribuição de renda. E não vejo nessas forças de Direta - de ultra-Direita, inclusive - disposição para isso, obviamente. Assim como também me preocupo muito com a elevada instabilidade, inclusive do ponto de vista de investidores. Não foi um ou dois empresários, Paulo Henrique Amorim, que me disseram quanto a insegurança de seus investimentos, porque num país em que o mandato presidencial pode ser violado desta forma, dá a impressão a quem está do outro lado dos oceanos, que tudo pode acontecer. E isso não é bom para o Brasil, inclusive para a realização de investimentos privados. De modo que eu vejo infelizmente com muita preocupação isso tudo. E, por isso, continuo a sustentar com muita firmeza que esse não é um caminho bom para Brasil.


E, só como detalhe, neste momento e ao longo do dia de hoje, a Bolsa de Valores de São Paulo fechou em queda, apesar da vitória política que os supostos empresários tiveram ontem…
Isso há de significar alguma coisa. Significa que, para além das especulações imediatas, como se diz na linguagem popular, caiu a ficha. Realmente isso vai conduzir o país para um caminho absolutamente inesperado e inusitado. Nós vamos ter que trabalhar muito para evitar um desastre de grandes proporções.


Ouça a íntegra da entrevista: