Maluf pode concorrer. Lula, não
(Crédito: Aroeira)
O Conversa Afiada tem o prazer de publicar sereno (sempre!) artigo de seu colUnista exclusivo Joaquim Xavier:
Só no desmoralizado sistema judiciário brasileiro uma criatura como Luiz Fux pode pontificar como “juiz” da suposta mais alta corte do país. Fux é uma daquelas aberrações próprias de um ambiente apodrecido pela combinação de uma elite primitiva, capitalismo selvagem e uma mídia infame.
Conhecido como o Zé bonitinho da escolinha da professora Cármen Lúcia, que alguns chamam de supremo, Fux nunca produziu uma contribuição digna de nota ao Direito ou à literatura jurídica. Mas o que falta nesse campo, transborda no terreno das vulgaridades arrivistas.
Tal “juiz” ficou conhecido pela desenvoltura calhorda para cavar sua nomeação. Prometeu ao então ministro José Dirceu que ia “matar no peito” decisões incômodas ao governo da ocasião. Mais tarde, diz-se, chegou a beijar os pés da mulher do então governador Sérgio Cabral para agradecer o apoio à sua indicação. Fez campanha aberta e ofereceu favores para alçar sua filha ao cargo de desembargadora no Rio. Isso é o que veio a público. Imagine-se o que mais não ocorreu nos bastidores além de genuflexões e pés beijados.
No campo jurídico, a façanha mais comentada de Fux atualmente é a liminar do auxílio- moradia. Ocioso se estender demais sobre a caráter sem-vergonha, imoral e furtivo da medida. O esbulho de Fux favorece a filha que tem dois imóveis numa das regiões mais valorizadas, senão a mais valorizada, do Brasil: o Leblon do Rio. Libera a prebenda a “magistrados” proprietários de 60 imóveis. Fosse o Brasil um lugar minimamente justo, a Fux seria imputado crime de responsabilidade e decidido seu afastamento sumário de qualquer função judicial. Mas não. Colunistas mervalianos e gasparistas, a grande mídia e “juristas” de aluguel celebram a excrescência. Afinal, Fux é contra Lula. O resto não vem ao caso.
Foi o que ele provou com todas as letras ao assumir a presidência do dito tribunal eleitoral. A lei sou eu, decretou o cabeleira em seu discurso de posse. Lula não vai ser candidato de jeito nenhum. Confiem em mim, barões do dinheiro grosso, imprensa golpista, multinacionais abutres e calhordas que se aboletam no Congresso Nacional, Esplanada dos Ministérios e palácio do Jaburu.
A lei, ora a lei. Vale a pena relembrar, contudo, episódio recente a demonstrar o papel indecente e parcial de Fux nesta empreitada. Nas eleições de 2014, havia um candidato a deputado federal condenado em segunda instância pela roubalheira em obras de São Paulo. O cidadão chegou a ser impugnado pelo tribunal regional eleitoral e mesmo pelo superior. Graças aos recursos a mão, o candidato mesmo assim teve o nome estampado na urna eletrônica. Recebeu 250 mil votos. Como estava impugnado, os votos num primeiro momento foram desconsiderados.
Eis que Paulo Maluf –este era o tal candidato—recorreu até o fim e o tribunal superior mudou de lado. Claro, adivinhem quem articulou a mudança: ele mesmo, Gilmar Mendes, ao lado de seu aluno mais aplicado, José Toffoli. A alegação: o crime de Maluf não era doloso, e a ficha limpa só vale para crimes dolosos. Conseguiram provar que Maluf não teve intenção de roubar, risos à parte.
Tem-se então a seguinte situação: Paulo Maluf, um ladrão de carteirinha, recuperou seus votos e assumiu o mandato. Tudo dentro da lei vigente. Agora, para Lula, a conversa é outra. A lei mudou? Não. Mudou o réu.
A qualquer um com alguma honestidade salta à luz o esbulho em andamento. Enquanto as provas contra Maluf eram e sempre foram abundantes --hoje ele está preso, embora de forma cenográfica e hipócrita, pois quando estava na ativa ninguém o incomodava, mas isto é outra história--, enquanto Maluf se beneficiou da lei corrente, agora querem fechar as portas para Lula ao arrepio desta mesma lei. Com uma agravante decisiva: contra Lula não há provas, fato extensamente demonstrado por juristas nacionais e internacionais insuspeitos e endossado pela esmagadora maioria da população ouvida em pesquisas. O importante é que, mesmo considerando o cartel golpista do TRF-4, a legislação em vigor permite que Lula chegue à urna.
A defesa de eleições sem fraude não pode se resumir aos tortuosos caminhos jurídicos. Mas não pode dispensá-los em nenhum instante. Não fosse pelo imperativo da luta política, até como forma de escancarar a falência deste judiciário que aí está. O caminho esboçado por Sepúlveda Pertence, de biografia não propriamente ilibada, equivale a uma rendição antecipada. Escambar a liberdade de Lula pela sua eliminação como figura política é uma falácia, é ceder à chantagem. Como se todos não soubessem que o que garante Lula fora da cadeia é sua atuação como o mais importante líder popular da história do Brasil. Pertence começou mal, para dizer o menos.
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