Paulo Lacerda: ideia da Lava Jato sempre foi tirar Lula da Eleição!
O Conversa Afiada reproduz trecho de reportagem da Agência Pública em que Vasconcelo Quadros entrevista o delegado da PF Paulo Lacerda (clique aqui para ler a íntegra).
Lacerda é uma das maiores referências em investigações de crimes financeiros. Ele foi o responsável por desvendar o esquema de corrupção no Governo Collor e indiciar a ex-Ministra da Fazenda Zélia Cardoso de Mello.
Criou a Divisão de Repressão ao Crime Organizado e Inquéritos Especiais (Decoie) e virou diretor-geral da PF em 2003, com Lula na presidência e Márcio Thomaz Bastos no Ministério da Justiça.
Foi, também, o responsável por escolher o delegado Protógenes Queiroz para liderar a Operação Satiagraha, aquela que deveria colocar o ínclito banqueiro atrás das grades, não fosse o Ministro Gilmar Mendes, que concedeu dois HCs a Dantas em 48 horas, num recesso do Supremo, mesmo depois de o jornal nacional mostrar que ele (o banqueiro) tinha subornado um agente federal.
O ministrário, aliás, também protagonizou o episódio que levou ao enforcamento de Paulo Lacerda quando este, Lacerda, já dirigia a ABIN, no Governo Lula.
(O lamentável episódio - uma das páginas cinzentas do Governo Lula - está descrito, nos mínimos detalhes, no best-seller "O Quarto Poder- uma outra história").
Gilmar chamou o Presidente Lula às falas porque tinha sido grampeado (pela ABIN), numa conversa com o ínclito senador Demóstenes Torres.
O indesmentível livro "Operação banqueiro", de Rubens Valente (onde se lê que "sem Gilmar não existiria Daniel Dantas") mostra que jamais se ouviu o áudio desse grampo.
Foi um grampo sem áudio!
O Ministro Nelson Johnbim também ofereceu determinante colaboração no episódio.
Foi ele quem apresentou ao Lula (sabe-se lá por que ele estava na fatídica reunião) uma "babá eletrônica" com a qual Lacerda teria feito o grampo.
A babá era uma fraude, uma geringonça que se compra pela internet...
Num dos episódios cinzentos de seu governo, Lula cedeu à pressão e , por sugestão do então Ministro da Justiça Tarso Genro, designou Lacerda para um Sibéria amena: ser adido policial na Embaixada em Lisboa.
De volta a 2018, veja o que disse Lacerda à Agência Pública:
(...) Voz solitária
Lacerda é uma voz quase solitária no meio policial a apontar, nos bastidores, os exageros da Lava Jato. Acompanha de perto o roteiro de investigações que deram protagonismo a procuradores que, em sua época no comando da PF, apenas cumpriam o principal papel do Ministério Público (MP), que é fiscalizar o trabalho da polícia e auxiliar nas investigações para que a denúncia resulte numa ação penal bem instruída, que dê ao julgador parâmetros para uma sentença justa. Lacerda acha que, ao “puxar o freio de mão” na ofensiva contra políticos, a PF acabou abrindo caminho para que o MPF se projetasse como protagonista da nova era.
Percebendo que o órgão recuara, o MPF pegou carona na onda das grandes manifestações de 2013, promoveu uma campanha publicitária contra a corrupção, criou uma força-tarefa e assumiu a paternidade da Lava Jato, investigação que havia sido iniciada pela PF. Os procuradores já haviam tentado, sem sucesso, assumir investigações no período de Lacerda.
“Não tem problema. Os senhores serão bem-vindos. Nós temos centenas de inquéritos que estão parados ou andando devagar por falta de gente”, reagiu Lacerda numa reunião com procuradores. Foi uma ducha de água fria. O que o MPF queria não eram investigações triviais, de rotina. Na opinião de Lacerda, o MPF queria investigar alvos que atraíssem holofotes.
Em 2009 o então procurador-geral da República Roberto Gurgel encontrou uma forma de colocar o MPF nas investigações: criou, por norma aprovada no Conselho Nacional do Ministério Público, o chamado PIC, sigla de Procedimento de Investigação Criminal, pelo qual passou a abrir inquéritos para atuar nos casos de maior repercussão.
O problema é que a norma que instituiu o PIC passava por cima do que diz a Constituição, que define com clareza o papel de cada instituição no sistema penal: polícia investiga, procurador denuncia e juiz julga. Em 2013, no entanto, aproveitando-se da difusa pauta que emergia da onda de protestos, promotores e procuradores se incorporaram às manifestações para bradar contra a corrupção e derrubar a emenda parlamentar, a PEC-37 que, redundante, propunha exatamente o que está na Constituição. Por pressão das ruas, a PEC, que afastaria o MP de investigações sobre corrupção se aprovada, acabou esmagada na Câmara dos Deputados por 430 votos a favor do arquivamento e 9 contra.
Diante do grande número de investigações baseadas na norma e da insegurança jurídica gerada, o STF se viu obrigado a analisar a validade dos PICs, questionado por mais de uma centena de ações que pediam sua anulação, sob o argumento de que era inconstitucional. No final, contra o que havia decidido a Constituinte de 1988, o STF acabou validando as investigações do MPF, consolidando também o interminável conflito com a PF em torno da prerrogativa de investigar. Do contrário, teria de anular dezenas de processos, alguns deles relacionados ao PCC.
Lacerda achava que, ao assumir investigações, o MPF usurparia uma atribuição histórica da polícia e perderia a isenção necessária para formular a denúncia. Havia também uma razão prática: um procurador, culturalmente habituado a pedir e analisar inquéritos, não tem experiência em investigação de rua nem a sagacidade inerente ao policial e, portanto, poderia cometer equívocos ou ser levado na lábia.
O acordo de delação dos irmãos Joesley e Wesley Batista, da JBS, que corre o risco de ser anulado, parece dar razão ao delegado. Além disso, o novo papel impôs ao MPF um ônus moral, com sérias suspeitas de envolvimento com corrupção na medida em que integrantes da instituição se viram obrigados a botar o pé na lama. O caso mais visível está no noticiário e ainda renderá: estrategista dos acordos de delação, o ex-procurador Marcelo Miller, um dos braços do ex-PGR Rodrigo Janot, acusado de ter mudado de lado e de receber dinheiro da JBS enquanto ainda estava ligado ao MPF, é agora réu acusado de corrupção.
O protagonismo sobre a Lava Jato deu ao MPF poderes jamais alcançados pela instituição. Só agora, quatro anos depois, é que o STF centrou foco na análise da principal ferramenta das investigações, a delação, base principal de uma infinidade de prisões e de condenações. A Segunda Turma do STF já rejeitou a colaboração premiada de réus como fundamento exclusivo para condenação, entendimento que poderá favorecer Lula, condenado a 12 anos e um mês pela delação do empresário Léo Pinheiro, ex-dirigente da OAS.
O roteiro seguido pelos investigadores no caso do tríplex, segundo o delegado, revela que a intenção de desconstruir Lula politicamente foi mais forte do que o combate a corrupção. “Foram com sangue na boca. A ideia era tirar Lula do processo eleitoral. Para julgá-lo rapidamente, o tribunal furou a fila. Antes do processo do tríplex, havia mais de cem casos esperando para entrar na pauta”, diz Lacerda.
Mesmo considerando que o ex-presidente tenha cometido algum delito, o delegado afirma que a pena e a prisão são desproporcionais: “A base da condenação é frágil. O máximo que o Lula poderia pegar seria uma pena alternativa, como distribuição de cestas de alimentos à comunidade, ou uma prisão domiciliar”.